São Paulo, segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

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Outro lado

Apliquei dose de passarinho, diz médico

Psiquiatra Sabino Ferreira de Farias Neto nega que o coquetel de medicamentos tenha matado o lutador de jiu-jítsu

ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA

O psiquiatra Sabino Ferreira de Farias Neto, 56, nega que o coquetel de medicamentos indicado por ele tenha sido responsável pela morte do lutador de jiu-jítsu Ryan Gracie, 33. "Como me disse um colega, a dose que apliquei foi de passarinho. Tenho o maior pesar pelo que ocorreu, mas eu lutei contra isso com tudo o que sei."
Farias Neto não quis falar sobre qual seria a verdadeira causa da morte do lutador. "Reservo-me o direito de esperar a necropsia para depois comentar. O IML tem todas as condições e a competência para dar a resposta certa. Se o resultado for contra mim, vou ter que acatar. A verdade deve prevalecer, sempre. Doa a quem doer."
O psiquiatra conta que aplicou seis medicamentos (tranqüilizantes, antipsicóticos e contra hipertensão) em Gracie. Três comprimidos de Dienpax, dois de Topamax, um de Capoten e outro de Leponex, além de duas ampolas de Fenergan e outras três de Haldol.
Ele diz que entende a dor da família ao anunciar que pretende processá-lo. "É um direito de qualquer um. Compreendo e respeito a atitude emocional vivida por eles neste momento."
Mas o médico refuta que tenha feito proposta de pagar propina a policiais de diferentes esferas para que Gracie tivesse tratamento privilegiado na delegacia. Segundo ele, os R$ 5.000 (R$ 3.000 em dinheiro e R$ 2.000 em cheque), pagos pela namorada do lutador, são referentes aos seus serviços médicos. "Só para me locomover de Atibaia a São Paulo são mais de duas horas", justifica-se. "Quando fui contatado, disse a ela que meu preço era alto."
Farias Neto não encara como propina a sugestão feita por ele, à namorada de Gracie, de pagar R$ 100 ao carcereiro do 91º Distrito Policial, na Vila Leopoldina (zona oeste de SP), onde o lutador foi encontrado morto.
"O Ryan poderia querer uma pizza ou um McDonald's. A minha intenção era só facilitar o tipo de comida." Questionado se o pagamento foi feito, o psiquiatra diz que não. "Sou íntegro. Não me submeteria a oferecer propina a policiais."
O médico conta, porém, que pagou R$ 30, em cheque, por três garrafas de água mineral de 500 ml cada uma, a um policial, enquanto estava no IML para exame de corpo de delito em Gracie. "Só tomo água com gás. O policial nem queria aceitar o cheque. Ele foi buscar e não cobrou nada. Por favor, eu não tenho o direito de dar gorjeta?"

Clínica de luxo
Aparentemente abatido, o psiquiatra, baiano de Salvador, contou que está completamente arrasado. "Fiquei 48 horas sem dormir." Antes de iniciar a entrevista, ontem à tarde, em Atibaia (60 km a norte de SP), na Comunidade Terapêutica Maxwell, especializada em atendimento a dependentes de drogas e álcool, o psiquiatra fez questão de exibir fitas de vídeo em que aparece como entrevistado e eventos de despedida de pacientes em sua clínica.
Na sala, um quadro de Sigmund Freud, fotos do dalai-lama e um quadro de Jesus Cristo, presentes, segundo o médico, de gente atendida por ele.
Formado em psiquiatria pela USP, "por causa do meu irmão, 15 anos mais velho, que tinha problemas psiquiátricos", Farias Neto mantém a clínica há 31 anos. Sua assistente fez um "tour" com a reportagem.
São 50 apartamentos, numa área de 12 mil m2, monitorada por 80 câmeras. Ontem, havia cerca de 30 pacientes internados de diferentes partes do Brasil e até do exterior.
Os apartamentos contam com TV e banheiro. Há um amplo refeitório, área de jogos, quadra, piscina e espaço coletivo com TV de tela plana para karaokê e sessões de DVD. O preço por pessoa varia de R$ 10.500 a R$ 30 mil mensais, fora o custo com a medicação, receitada e aplicada diretamente pelo próprio psiquiatra.
Farias Neto fez questão de mostrar que a entrevista estava sendo gravada pelo circuito interno de TV. No final da conversa, o médico tomou um comprimido de Dienpax, sem água, "para ficar mais calmo".


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