São Paulo, segunda, 18 de maio de 1998

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VÍCIO
Índice foi constatado na escola estadual Alves Cruz, onde há laboratório de psiquiatras que analisam distúrbios de alunos
65% de alunos de escola pública bebem

GILBERTO DIMENSTEIN
do Conselho Editorial

RENATO KRAUSZ
da Reportagem Local

Transformada num laboratório de psiquiatras da USP para investigar distúrbios de estudantes, a escola pública estadual Alves Cruz revela que 65% de seus alunos usam álcool com frequência.
Os pesquisadores descobriram que o uso do álcool está associado aos mais variados riscos de vida, da violência ao sexo inseguro.
Conduzida pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina, a pesquisa capta um fenômeno nacional: o crescente aumento de consumo de bebida entre estudantes. "Os pais têm um comportamento estranho. Morrem de medo da maconha, mas não se incomodam quando os filhos se embebedam", afirma Sílvia Gouveia, coordenadora pedagógica da Associação das Escolas Particulares de São Paulo.
Nas reuniões dos diretores das escolas privadas, segundo ela, sempre surgem relatos sobre festas de estudantes que acabam em internações hospitalares.
Mas, nas escolas particulares, em geral, existe uma recusa em admitir as ocorrências para não afetar a imagem. Pela primeira vez em 50 anos, o problema do álcool nas escolas vai fazer parte do temário de um congresso da Confen (Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino), que ocorre em setembro no Anhembi.
"A bebida virou o principal atrativo das festas de grêmios", diz a psiquiatra Sandra Scivoletto, coordenadora-executiva do Grea (Grupo Interdisciplinar de Estudos sobre Álcool e Droga), da USP. A psicopedagoga Cybele Weinberg aprendeu um truque sobre como os alunos disfarçam o hálito da bebida: usam vodca.
A mais completa investigação sobre consumo de bebidas nas escolas é a pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, que faz levantamento com 15 mil estudantes desde 1986.
Realizada pelo Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), a última versão, concluída no ano passado, indica que pelo menos 15% dos estudantes sejam consumidores abusivos.
"Constatamos que a idade do consumidor está caindo", afirma Elisaldo Carlini, chefe do Cebrid.
De acordo com o levantamento, metade dos alunos entre 10 e 12 anos já beberam. Do total, 30% já ficaram totalmente bêbados. Depois de beber, 11% dos estudantes brigaram e 20% faltaram às aulas. "Nenhuma droga é mais devastadora do que a bebida", afirma Carlini. Ela é responsável por 90% das internações hospitalares por dependência; está no sangue de 70% das vítimas de morte violenta.
"A verdade é que existe tolerância", sustenta Artur Guerra, coordenador do Grea. Essa tolerância vai, segundo ele, transformando bebedores eventuais em frequentes, até produzir o alcoólatra.
Guerra coordena levantamentos sobre consumo de álcool entre universitários. "Nas festas, o coma alcoólico tem se transformado em fato normal." Pesquisas coordenadas por Guerra mostram que, dos estudantes da USP no interior, 73,4% bebem frequentemente. Na capital, são 74,1%.



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