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São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 2003

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AMBIENTE

Ocupações em parque do Rio começaram nos anos 50; hoje, área tombada abriga casebres, prédios de luxo e até delegacia

Invasões destroem 15,8% do Jardim Botânico

MAURÍCIO THUSWOHL
DA SUCURSAL DO RIO

O Jardim Botânico do Rio já perdeu 217 mil metros de reservas de mata atlântica, o equivalente a 15,8% de sua área original, devido a invasões. Fundado em 1808, o local possui 7.200 espécies de plantas de vários lugares no mundo e é considerado pela ONU (Organização das Nações Unidas) um dos dez mais importantes do mundo.
As ocupações irregulares começaram no início dos anos 50, protagonizadas pelos próprios funcionários do Jardim Botânico. Continuam até hoje, num processo de degradação ambiental da área que é considerada bem público federal e tem sua administração diretamente subordinada ao Ministério do Meio Ambiente.
O Jardim Botânico é tombado pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e é considerado pela Unesco parte da Reserva da Biosfera mundial. O parque tem, entre outros bens, um herbário com 360 mil amostras de plantas desidratadas e uma biblioteca, também tombada, que abriga 66 mil volumes e 3.000 obras raras.
As invasões mais recentes, feitas por famílias de baixa renda, tomam a encosta situada atrás da rua Major Rubem Vaz, onde coexistem prédios de luxo, uma delegacia de polícia e um quartel do Corpo de Bombeiros.
"Algumas construções podem ser classificadas como mansões. Os ocupantes são evidentemente ricos, não pagam nem sequer um centavo para ficar em uma área privilegiada e, certamente, não são filhos de ex-funcionários", diz o presidente do parque, Liszt Vieira.
Conhecida como Titica, a encosta já tem cerca de 30 casas e é considerada pela administração do Jardim Botânico o ponto mais vulnerável a novas ocupações irregulares. Sua última construção, um barraco de tijolos com dois cômodos, foi erguida há dois anos sobre uma rocha.
Advertida pela segurança do parque de que sua casa está em área de risco, a paraibana Francisca Ivanilda, 30, diz não ter para onde levar os filhos Daniel, 3, e Zeca, 4. "Aqui acontecem muitas ventanias, e dizem que a casa vai cair e matar minha família."
Vizinho de Ivanilda, o aposentado Expedito Nery, 67, que diz morar no local há 56 anos, conta que, até seis anos atrás, pagava uma taxa de ocupação à SPU (Secretaria de Patrimônio da União), que deixou de ser enviada. "Pararam de cobrar a taxa para poderem dizer que estamos aqui ilegalmente e nos expulsarem."
Segundo Vieira, cerca de 460 famílias vivem hoje dentro da reserva. Para conhecer o número exato de moradores, Vieira firmou convênio com o IBGE, que realizará o primeiro censo oficial dos habitantes do Jardim Botânico.
Nos anos 50, o Ministério da Agricultura permitiu que os funcionários construíssem casas dentro do parque, pela dificuldade de acesso ao local.
As casas se multiplicaram e, nos anos 60 e 70, alguns moradores obtiveram títulos de cessão de uso dos terrenos, concedidos pela SPU. Hoje, não é mais possível identificar quem é de fato descendente dos antigos funcionários ou simplesmente um invasor.
"As ações na Justiça podem levar ainda mais de dez anos. O caminho a seguir com esses moradores é o da solução negociada", afirma Vieira. Segundo ele, nos últimos anos a AGU (Advocacia Geral da União) deu entrada em mais de 300 ações de reintegração de posse a favor do parque.
Segundo o acordo, idealizado por Vieira, o Jardim Botânico cederia uma parte de seu terreno onde, com financiamento da Caixa Econômica Federal, seriam erguidos quatro ou cinco pequenos prédios de apartamentos, onde viveriam os moradores, hoje dispersos no terreno.


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