São Paulo, sábado, 18 de setembro de 2004

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EDUCAÇÃO

Parecer da Advocacia Geral da União assegura a estudante vaga em instituição pública em caso de transferência

Militar ganha privilégio em universidade

LUCIANA CONSTANTINO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Reitores das universidades federais estão contrariados com um parecer da AGU (Advocacia Geral da União) que garante vaga a militares e a seus dependentes que pedirem transferência para universidades federais, mesmo que estejam matriculados em uma instituição particular.
A UnB (Universidade de Brasília) está ameaçando suspender o próximo vestibular para o curso de direito, alegando que não teria condições de atender aos cerca de 70 pedidos de transferência de militares para o curso.
A universidade diz ter recebido, entre janeiro e agosto deste ano, cerca de 300 pedidos de transferência, sendo 90% deles de militares e dependentes -a maioria vinda de instituição particular.
A Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) encaminhou carta ao ministro da Educação, Tarso Genro, manifestando "indignação" e "preocupação". Também pretende adotar medidas judiciais para tentar reverter o parecer, que tem força de lei para a rede federal.
A UnB informou ontem que vai recorrer ao próprio advogado-geral da União, Álvaro Augusto Ribeiro Costa, para que ele reavalie essa decisão.
"Foi criado [com o parecer] um tratamento diferenciado entre os servidores civis e militares. Com o parecer, um aluno pode fazer um vestibular na esquina e, no dia seguinte, ser estudante da UnB", afirmou o vice-reitor da universidade, Timothy Mulholland.

A legislação
A decisão da AGU põe fim a uma interpretação dúbia da lei 9.536/97, que determina que instituições de ensino superior, sejam públicas ou particulares, têm de aceitar pedidos de transferência de servidores federais civis e militares e de seus dependentes em caso de remoção pelo ofício.
Havia uma interpretação de que as transferências podiam ser aceitas entre instituições da mesma natureza, ou seja, de públicas para públicas e de particulares para particulares. Na prática, as federais adotavam essa visão.
Por isso, houve caso de militares que entraram na Justiça para ter o direito de se matricular em uma federal mesmo vindos de uma instituição particular.
No parecer desta semana, a AGU entende que, no caso dos militares e seus dependentes, as universidades federais têm de aceitá-los quando solicitam a transferência provocada por mudança de domicílio, independentemente de o aluno vir de outra instituição pública ou de privada.
A medida não se aplica a servidores civis, para os quais as instituições continuam adotando a interpretação anterior.
Para emitir seu parecer, a AGU se baseou nos argumentos do Ministério da Defesa e em decisões da Justiça.
"O parecer não mudou em nada a legislação que já existe. Ele apenas firma posição com base no espírito da lei, que é preservar o direito dos militares", disse o general José Luiz Halley, assessor especial do Ministério da Defesa.
Segundo ele, os oficiais são levados pela própria carreira a mudar de cidade a cada dois ou três anos. "O que vinha acontecendo era a transferência do militar, mas este deixava o filho porque estava cursando a universidade. O Estado, se envia um militar para uma missão, deve se preocupar com a preservação da estrutura familiar."
Na argumentação apresentada à AGU, o Ministério da Educação defendia que as transferências deveriam ser feitas de públicas para públicas e de particulares para particulares. Previa como exceção o caso do aluno matriculado em instituição privada que se mudasse para um local onde não existisse o mesmo curso também numa privada. Ontem, o ministro Tarso Genro disse que não cabe ao MEC discutir a orientação do parecer.

Reação
A presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), Ana Lúcia Gazzola, disse que o parecer fere a autonomia universitária.
"É uma reserva de vagas sobre o privilégio corporativo. Como ficam os outros candidatos? É muito grave. Os reitores estão estarrecidos", disse Gazzola.
O general José Luiz Halley diz entender os argumentos das instituições, mas lembrou que o direito de transferência já estava assegurado na lei de 1997.
O vice-reitor da UnB (Universidade de Brasília), Timothy Mulholland, também considera que a decisão fere a autonomia universitária.
Segundo ele, mesmo que os transferidos não entrem no primeiro semestre, a universidade não tem como absorvê-los sem planejamento.


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