São Paulo, domingo, 18 de novembro de 2001

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Uso de anti-hipertensivo diminui reincidência da doença

DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo internacional mostra que o tratamento de vítimas de AVC (Acidente Vascular Cerebral) com anti-hipertensivos reduz em 28% a incidência de um segundo AVC, além de diminuir os índices de ataques cardíacos. Um a cada cinco doentes sofre um segundo derrame em cinco anos.
Atualmente apenas as vítimas de AVC hipertensas controlam a pressão arterial com medicamentos à base da droga perindopril, inibidora da enzima conversora da angiotensina (ECA).
O estudo demonstrou que os anti-hipertensivos devem ser adotados também para as pessoas com pressão normal. Mais de dois terços dos derrames ocorrem em pessoas que não têm pressão alta, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).
As drogas, diz o estudo, também reduziram o risco de complicações sérias como demência e declínio da função cognitiva.
O trabalho, batizado como Progress, que investigou 6.000 pacientes vítimas de derrame em 172 países ao longo dos últimos cinco anos, foi apresentado no último fim de semana no 3º Congresso Brasileiro de Doenças Cérebro-Vasculares, no Rio.
Para o médico francês Cristophe Tzourio, diretor de pesquisas do Hospital La Sapatriere, em Paris, que participou da elaboração do Progress, o estudo mostrou que o conceito de pressão alta deverá ser revisto. A seguir, trechos da entrevista que Tzourio concedeu à Folha por e-mail.

Folha - De que maneira os resultados do estudo Progress vão mudar a conduta médica?
Cristophe Tzourio -
O Progress demonstrou que a definição de hipertensão necessita de revisão nos pacientes que sofreram AVC (ou seja, será que, nesse caso, a pressão normal, a que seria melhor para o paciente, não deveria ser mais baixa?). No estudo, mesmo no grupo rotulado como normotenso, o tratamento utilizado no Progress -com as drogas perindopril e indapamida- foi eficiente em reduzir a chance de um evento vascular subsequente.
A nova recomendação seria que todo paciente que venha a sofrer um AVC ou que tenha sofrido um AVC nos últimos cinco anos seja um candidato ao tratamento com perindopril e indapamida.

Folha - Quais são os efeitos colaterais que o uso sistemático dos anti-hipertensivos podem trazer às pessoas que têm pressão normal?
Tzourio -
Quando o estudo Progress foi desenhado, havia muita incerteza. Os médicos temiam o risco de hipotensão, ou seja reduzir muito a pressão e provocar sintomas como tonteira, náuseas e sonolência. Os medicamentos selecionados para o estudo são reconhecidos por sua eficácia em controlar a pressão arterial, e, além disso, o perindopril tem qualidades particulares: um efeito prolongado que permite uma tomada única diária, com um efeito regular sobre a pressão (não a reduz abruptamente). Também reduz a pressão arterial, mantendo o fluxo cerebral (sem interferir negativamente sobre ele). A tolerabilidade ao tratamento nos quatro anos do estudo foi excelente.

Folha - De que forma as drogas reduzem o risco de complicações sérias como demência e incapacidade nas vítimas de AVC?
Tzourio -
Esse foi um resultado muito importante do estudo que mostrou pela primeira vez ser possível prevenir a demência e a incapacidade após o AVC. Com esse tratamento foi possível reduzir em 35% o risco de demência pós-AVC. Esse resultado é ainda mais forte em pacientes que não tinham nenhum déficit cognitivo no início do estudo. Nesse grupo, a proteção chegou a 50%.

Folha - Atualmente as vítimas de AVC usam aspirina para evitar um novo derrame. O uso desse medicamento deve ser suspenso?
Tzourio -
Cerca de 60% dos pacientes no estudo Progress estavam utilizando aspirina. Como em todo estudo randomizado [processo de divisão dos pacientes que garante uma uniformidade entre os dois grupos do estudo", houve a mesma proporção de pacientes usando aspirina nos dois grupos [ativo e placebo". Em outras palavras, o efeito do tratamento utilizado no Progress foi adicional ao efeito protetor da aspirina. Drogas com ação antiagregação plaquetária [aumentam a viscosidade do sangue", como a aspirina, têm provado ser uma proteção modesta, porém significativa no AVC recorrente, no caso dos pacientes que tiveram um primeiro AVC do tipo isquêmico [no caso de AVC hemorrágico, a aspirina está contra-indicada". Portanto, para os casos de AVC isquêmico, os pacientes devem continuar recebendo drogas antiagregantes e, após o estudo Progress, eles também devem receber perindopril e indapamida.


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