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PASQUALE CIPRO NETO
O xiita, a rainha, o juiz, a juíza...
Será que não existe acento agudo em vocábulos como "rainha" ou "xiita" porque sempre existem exceções?
NA SEMANA passada, movido
pela palavra "paí", presente
no título do filme "Ó Paí, Ó",
comentei o fenômeno fonético que
nela há -o hiato ("vogais consecutivas que pertencem a sílabas diferentes"). Vimos que há acento agudo no
"i" e no "u" quando essas vogais (tônicas) são as segundas de um hiato,
desde que sós ou acompanhadas de
"s" (coíbe, faísca, Jaú, balaústre). É
por isso que há acento em "juíza" e
"raízes", mas não em "juiz" e "raiz".
Como vimos, essa regra segue o
fundamento de todo o nosso sistema de acentuação: o da comparação/exclusão. Se há acento em "possuí" e "baú" (hiato), não há em "subtrai" e "pau" (ditongo). Esses casos
de hiatos e de ditongos são excludentes (em termos de acentuação
gráfica) justamente porque há hiatos e ditongos que se representam
graficamente da mesma maneira.
Em termos práticos, essa regra de
acentuação existe para que não se
leia "doido" quando se quer dizer
"doído" (um processo "doido" é diferente de um processo "doído") ou
"cai" quando se quer dizer "caí"
("Cai fora" é diferente de "Caí fora").
Muitos leitores escreveram para
perguntar por que em palavras como "xiita" ou "rainha" não há acento
agudo se nelas há todo o roteiro para
que se ponha esse bendito sinal diacrítico na segunda vogal ("i", tônica)
do hiato. "Ou será que a imprensa
toda erra quando escreve "xiita" sem
acento?", perguntaram alguns.
Não erra, não. Para entender o
porquê disso, convém relembrar
(com outro exemplo prático) os fundamentos do nosso sistema de acentuação gráfica: acentuamos uma
oxítona terminada em "em" (como
"vintém", "armazém" etc.) porque
não acentuamos (ou para não acentuarmos) uma paroxítona de mesma terminação, como "coragem",
"nuvem", "homem", "item" etc.
E por que as escolhidas para "ganhar" o acento foram as oxítonas
terminadas em "em" e não as paroxítonas que têm essa terminação?
Porque sempre se acentuam as palavras que pertencem ao grupo minoritário. Para comprovar que as paroxítonas terminadas em "em" são (infinitamente) mais numerosas que as
oxítonas, basta lembrar que 99,99%
dos nossos verbos têm flexões com
esse "perfil" ("amem", "encantem",
"sabem", "dizem", "permitem" etc.).
Posto (tudo) isso, vamos à ausência de acento em "campainha", "rainha", "xiita" etc. Na escola, muitas
vezes essa ausência é justificada
com a simplória desculpa da "exceção" (-"Por que não existe o acento?" - Exceção!"). Exceção coisa nenhuma. O que há é simplesmente o
seguinte: como não existe NENHUMA palavra na língua com ditongo
seguido de "nh", deixa de haver motivo para que se acentue a segunda
vogal do hiato que é seguido de "nh".
Trata-se, portanto, da obediência
estrita aos fundamentos das regras
de acentuação, que, como já se viu,
foram feitas para que se acentue o
menor número possível de palavras.
E "xiita"? Um picolé de limão para
quem me der uma palavra (uminha
só) em que haja o ditongo "ii". Se não
existe o ditongo "ii", não há razão
para que se acentue o segundo "i" do
hiato "i-i", como o que há em "xiita",
"mandriice", "vadiice" etc. "E o
acento em "friíssimo'?", perguntarão
alguns. A razão desse acento não reside no hiato; reside no fato de ser
proparoxítono esse vocábulo. É isso.
inculta@uol.com.br
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