São Paulo, quinta-feira, 19 de julho de 2007

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Enquanto aguardam pela identificação, parentes respiram a fumaça da tragédia

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

O jovem médico com o rosto molhado de lágrimas leva um crachá no peito onde se lê um nome feminino. Só o prenome. Não é um engano. Ela é a vítima. Ele, o parente dela. Cerca de cem familiares (boa parte proveniente de Porto Alegre) foram chegando ao longo do dia de ontem ao Pavilhão das Autoridades do aeroporto de Congonhas. Todos recebiam crachás em que se liam os nomes de seus parentes. O objetivo do encontro: colher radiografias, exames odontológicos e informações que ajudem na identificação das vítimas do acidente com o avião da TAM.
O pavilhão das autoridades é uma área reservada. É por lá, por exemplo, que o presidente Lula desembarca quando chega a São Paulo. Ontem, às 18h, o pavilhão com paredes revestidas de lambris e jogo de lustres que parecem saídos de uma ficção científica da década de 50 comportava pelo menos 200 pessoas -além dos parentes, havia policiais federais e civis, soldados do Exército, bombeiros, assistentes sociais, psicólogos, funcionárias da TAM e médicos legistas (muitos).
A menos de cem metros do local, estavam os destroços do avião e do prédio atingido no acidente. Também estavam corpos de vítimas que ainda não haviam sido resgatados. E muita fumaça preta -os que trabalhavam no resgate tinham de usar máscaras de proteção.
A proximidade entre os parentes e o cenário da tragédia era tanta que mesmo com portas e janelas fechadas por vidros e cortinas (para proteger a privacidade dos parentes), a bonita construção do pavilhão das autoridades estava tomada pelo cheiro de queimado.
No bufê ladeado por uma pintura mural de Clóvis Graciano e Di Cavalcanti, delicados atendentes serviam café, refrigerantes, sucos e sanduíches, que os parentes, no entanto, pouco consumiam. A maioria estava quieta, muitos choravam baixinho. Todos esperavam a hora de ser entrevistados pelos médicos legistas, que ficavam em um salão à parte, para conversas privadas.
Antes mesmo dessa conversa, contudo, os parentes já tinham sido informados, por exemplo, de que há corpos que, de tão queimados e machucados, não têm qualquer outra possibilidade de identificação que não o exame de DNA.
Um rapaz chora de aflição diante da perspectiva de nunca conseguir localizar o corpo da parente morta no acidente: "Se ela for uma dessas que só o DNA resolve, não vai dar. Ela era adotada".


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