São Paulo, terça-feira, 19 de setembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Após 29 anos, Justiça dá a aposentado prêmio da loteca

Apostador entrou com processo porque a casa lotérica não encaminhou sua aposta

Em 1977, ele e amigo acertaram os 13 pontos da Loteria Federal e deveriam ter recebido CR$ 189.289,20, o equivalente a R$ 104 mil

DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Vinte e nove anos sem fazer uma fezinha na loteria. Nem participar de bingos, nem concorrer em rifas. O aposentado Adhemar Salgado, 67, ficou traumatizado. Acertou os 13 pontos da Loteria Esportiva em 1977 e só na semana passada conseguiu o direito de receber seu prêmio, após uma longa disputa na Justiça. Na época eram CR$ 189.289,20, que equivalem agora a, no mínimo, cerca de R$ 104 mil.
Morador de um apartamento de classe média no Mandaqui, zona norte de São Paulo, Salgado diz que só vai fazer planos quando o dinheiro estiver em sua conta, mas não voltará a jogar na loteria tão cedo. A última aposta foi feita na quinta-feira de 25 de novembro de 1977. Era fim de tarde quando entrou na casa lotérica "A Sertaneja", em Bauru (343 km de SP), e entregou o jogo feito com o amigo Chicão. Pegou o recibo, foi para casa e passou o fim de semana torcendo. "Foi um sufoco. A partida da Portuguesa contra o Ceará quase põe tudo a perder", lembra. "Colocamos que a Portuguesa ia ganhar, e ela estava perdendo.
Conseguiu virar só no final." Quando acabaram os jogos da tarde de domingo, Salgado e o amigo Chicão comemoravam com o recibo da aposta na mão.
Fizeram um churrasco, brindaram e cada um ainda vendeu 10% de suas partes a dois amigos. "No fim, fomos quatro vencedores, que tinham filhos pequenos para criar e não viam a hora de receber o dinheiro." Segunda-feira amanheceu, e Salgado foi até a lotérica. Lá ficou sabendo que os funcionários não tinham encaminhado o jogo e, portanto, ele não tinha direito ao prêmio. Correu em busca de um advogado e acionou a Caixa Econômica Federal, que imediatamente fechou a casa de apostas, mas se negou a pagar o valor do prêmio.
O caso foi parar na Justiça em 1978, passou por várias instâncias e chegou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça). Na terça-feira passada, o tribunal decidiu, por unanimidade e em última instância, que a Caixa terá de pagar o prêmio. Não cabe mais recurso nessa etapa do processo. O próximo passo será definir qual o valor a ser pago.

Correção
O advogado de Salgado, Renério de Moura, diz que não tem idéia do valor porque a correção poderá ser feita de várias formas, desde índices da inflação até a equiparação com o dólar. Também não há previsão para o pagamento, mas ele espera que ocorra no começo de 2007. A Caixa, diz, só poderá questionar o valor. "O mérito foi julgado em várias instâncias, e sempre ganhamos. Eles só recorrerão se quiserem ganhar mais tempo." A Caixa enviou uma nota em que diz que se "trata de decisão ainda não publicada" e que só após a publicação será analisada a questão, para que se adotem as providências cabíveis.
A pedido da Folha, a Metha Consultoria fez os cálculos de atualização do valor do prêmio com base na correção pelo IPCA e com juros de 1% ao mês.
Hoje, os CR$ 189.289,20 equivalem a R$ 104.025,00. Salgado garante que vai dividir o prêmio com os amigos. "Apesar de ter mudado para São Paulo logo após essa confusão, continuamos em contato", diz. "Um deles já morreu, mas a família dele tem direito." O aposentado não quer nem fazer planos com o que irá receber. "Passei 29 anos esperando esse dinheiro. Graças a Deus, consegui criar meus quatro filhos sem ele. Hoje, já nem precisamos tanto." Em 1977, conta Salgado, sua parte do prêmio seria suficiente para comprar uma boa casa. Hoje, talvez não dê para o mesmo.
Sua mulher, dona Heloísa, não quer casa nem carro novo. Ao contrário do marido, ela já sabe como o dinheiro será gasto. "Minha filha caçula está se mudando com um dos meus netos para Manaus. Com o prêmio, poderemos comprar passagens e ir visitá-los sempre", afirma. "Essa aposta já deu muita dor de cabeça, mas agora vai servir para alguma coisa."


Com REGIANE SOARES , colaboração para a Folha


Texto Anterior: Asfalto novo: Prefeitura vai recapear ruas da "cracolândia"
Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.