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São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003

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SAÚDE

Estudos mostram que até 80% dos pacientes abandonam tratamento com medicamentos ou psicoterapia

Desistência é barreira para tratar depressão

DA REPORTAGEM LOCAL

Se na maioria das doenças é difícil que pacientes prossigam o tratamento, imagine o que ocorre com a depressão, cujo principal sintoma é a falta de vontade de fazer as coisas.
Estudos feitos fora do país mostram que até 80% dos pacientes abandonam o tratamento para a depressão, seja o realizado com remédios ou psicoterapia, o que traz o problema da falta de adesão ao centro dos debates sobre a doença. Esse foi o tema de uma das principais mesas redondas do último Congresso Brasileiro de Psiquiatria, que terminou na última sexta-feira em Goiânia (GO).
De 20% a 25% da população teve, tem ou terá depressão. Nos episódios espontâneos -aqueles que não têm relação com um acidente ou uma morte na família, por exemplo- há 50% de possibilidade de que se tornem recorrentes. Na maioria desses casos, o paciente terá de tomar remédios pelo resto da vida para viver bem.
"A depressão recorrente, que causa várias crises, pode atingir até 3% da população. E se não tratados, 15% dos pacientes suicidam-se", diz o psiquiatra Rogério Wolf de Aguiar, coordenador científico do congresso.
Além disso, quanto mais ocorrências, maior o risco de a doença não responder ao tratamento médico e de se tornar crônica.
Fernando Grilo Gomes, professor de psiquiatria da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), que pesquisou o porquê do abandono do tratamento, diz que o sucesso está relacionado principalmente à criação de um vínculo entre médico e paciente. Por isso é preciso evitar a troca frequente de terapeuta.
Gomes acompanhou 40 duplas de médicos e de pacientes depressivos no segundo semestre do ano passado. Estavam mais comprometidos os pacientes que perderam "o estigma da doença", como diz Gomes. "Aqueles que entendem que não têm culpa, que se trata de uma doença como outra qualquer", afirma o médico.
Estar precavido quanto a possíveis efeitos colaterais de antidepressivos (como o ganho de peso) também teve impacto positivo sobre a adesão ao tratamento.
A gama de mais de 30 antidepressivos existentes hoje no mercado, no entanto, traz maior possibilidade de evitar os efeitos indesejáveis.

Determinantes para adesão
No estudo inglês "The Task Force for Compliance" (Força-Tarefa para Adesão), realizado entre 1993 e 1994, sobre adesão a vários medicamentos, verificou-se que até 21% dos pacientes não adquiriam o receitado, até 59% não seguiam as instruções corretamente, 32% não compravam a segunda caixa do remédio e 15% abandonavam tudo antes do tempo.
Além da aliança médico-paciente, o uso de drogas de rápida ação, de poucos efeitos colaterais e fáceis de usar, é determinante para a continuidade de tratamentos, diz Antônio Geraldo da Silva, presidente da residência médica em psiquiatria da Universidade de Brasília e debatedor da questão da adesão no congresso.
No caso da depressão, ele enfatiza a necessidade de igual colaboração entre médicos e pacientes. O uso de álcool, café e nicotina em excesso com antidepressivos deve ser discutido. Com esses complicadores, afirma Silva, não há tratamento que dê certo. Segundo o médico, na psicoterapia é necessário ficar alerta para tratamentos longos que não dão resultado. (FABIANE LEITE)


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