São Paulo, domingo, 20 de março de 2005

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TERRA ESTRANGEIRA

Gente de outros países vem à procura de trabalho

Brasil tem 1,5 milhão de imigrantes irregulares

DEBORAH GIANNINI
DA REVISTA DA FOLHA

"Para el migrante, la patria es la tierra que le da el pan", diz o cartaz amarelado na porta do Centro da Pastoral do Migrante, no bairro da Liberdade, em São Paulo.
Cerca de 5.000 estrangeiros ilegais cruzam por ano aquela porta, em busca daquilo que a nova pátria ainda não conseguiu lhes prover: ajuda para pôr fim à própria clandestinidade.
Para o senso tupiniquim, talvez não seja compreensível que, entre tantos lugares do mundo, um estrangeiro escolha um país reconhecido como socialmente excludente para apostar sua esperança.
Estima-se que 1,5 milhão de estrangeiros vivam de forma irregular no Brasil. Das safras migratórias mais recentes, cerca de 80% são bolivianos, seguidos de peruanos, chineses e africanos (principalmente da Nigéria).
"O Brasil é a "América" para muitos estrangeiros. É como o brasileiro que vai para os EUA ou o Japão: "Vou ganhar US$ 2.000 por mês", comemoram. Na visão de americanos, isso não é nada, mas para ele e seu sonho de ajudar a família é muito", compara Luiz Eduardo Machado, chefe do setor de Registro de Estrangeiros na Polícia Federal de São Paulo.
Só que o perfil do brasileiro que deixa o país para "fazer a América" é bem diferente do perfil do boliviano que tenta a sorte aqui. "Entrar ilegalmente nos Estados Unidos exige uma reserva de US$ 15 mil, para o passaporte falso e o "coiote" que vai guiar o ilegal na travessia da fronteira México/ EUA. Esse brasileiro sai da classe média. O boliviano é quase sempre miserável. Muitas vezes vem sem dinheiro nenhum, orientado por coiotes pagos pelo dono da oficina de costura de São Paulo, com quem criam uma dívida a ser paga com meses de trabalho", diz o padre Roque Renato Pattussi, coordenador do Centro da Pastoral do Migrante.
De olho na mudança do panorama migratório ocorrido nos últimos anos, já existe uma comissão interministerial formada para discutir a reforma do Estatuto do Estrangeiro, criado em 1980. Por ser anterior à atual Constituição, de 1988, o texto atual diverge dela em alguns pontos, como nos que dizem respeito a saúde e educação. O estatuto não permite acesso do estrangeiro a esses serviços públicos; já a Constituição assegura tratamento igual a todos.
Hoje, conseguir permanência definitiva por aqui não é difícil: basta se casar com um local ou ter filho aqui sob sua guarda e dependência econômica. A questão é que a grande maioria dos imigrantes não se preocupa em obtê-lo porque não pretende, de início, viver "para sempre" no Brasil.
"Todo imigrante, quando sai de seu país, tem o princípio moral do retorno. "Eu vou, fico três anos e volto". Mas o retorno acaba sendo mais demorado porque ele não alcança o que planejava naquele período", diz o padre Roque.


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