São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997.

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DROGAS
Estudo realizado na Unifesp, a partir de relatos de usuário, aponta que 70% deixaram o crack definitivamente
Maconha é a nova arma contra o crack

AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

Fumar maconha poderia ajudar dependentes de crack a sair do mundo das drogas. O possível ``efeito terapêutico'' da cannabis aparece em estudo polêmico e inédito realizado pelo departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina (EPM) da Unifesp.
Durante 12 meses, psiquiatras acompanharam um grupo de 20 dependentes que relatavam estar fumando maconha numa tentativa de diminuir a compulsão e a ansiedade provocadas pelo crack.
No final do estudo, 14 deles -70% do grupo- tinham deixado de usar crack e estavam fumando maconha esporadicamente.
``Partimos do princípio de que a maconha tem um potencial curativo e que poderia ser uma droga de passagem'', diz o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, diretor do Proad, Programa de Orientação e Assistência ao Dependente da EPM, onde a pesquisa foi feita.
Usualmente, a maconha é tida como uma droga de passagem para drogas mais fortes. No estudo em questão, ela seria uma passagem de volta, um caminho para deixar drogas mais pesadas.
Dois especialistas ouvidos discordam totalmente do estudo. ``Quem tenta substituir uma droga por outra, acaba voltando para a mais forte'', diz o psiquiatra Jorge Cesar Gomes de Figueiredo, especialista em dependência química. O mais provável -diz a neuropsiquiatra Patrizia Streparava, da Associação Paulista de Medicina- é que ``a maconha nada tenha a ver com a recuperação''.
O estudo do Proad começou com relatos de dependentes de crack dizendo se sentir melhor ao fumar maconha. ``Era um dado que aparecia em relatos de jovens que chegavam procurando tratamento'', diz Eliseu Labigalini Júnior, que co-autor da pesquisa com o psiquiatra Lúcio Ribeiro Rodrigues.
Os 20 pacientes escolhidos para o estudo afirmavam que a maconha diminuía a fissura do crack -a ânsia para usar mais droga-, abria o apetite e permitia que dormissem melhor. Em vez de convencê-los a deixar a maconha -como aconteceria normalmente-, os psiquiatras optaram por saber os efeitos dela sobre o crack.
Os 20 pacientes -entre 16 e 28 anos- fumavam em média três cigarros de maconha por dia. Segundo os psiquiatras, depois de três meses de acompanhamento, 14 deles tinham diminuído significativamente o uso do crack. Ao final de um ano, os 14 relataram não estar mais fumando crack e o uso da maconha teria sido reduzido a um ou dois cigarros por semana.
Do grupo inicial, três deles deixaram o tratamento nos primeiros meses e três continuaram usando crack e maconha.
Como todos os pacientes do Proad, eles participavam de terapias em grupo uma vez por semana. ``É importante dizer que não sugerimos o uso da maconha'', diz Labigalini. ``Só acompanhamos um grupo de dependentes de crack que já fazia uso dessa droga.''
O estudo está disponível pela Internet na edição de fevereiro deste ano da revista ``Psyachiatry on Line'' (endereço abaixo). Segundo os autores, a pesquisa será publicada em revista especializada norte-americana nos próximos meses.


Endereço da ``Psyachiatry on Line": http://www.priory.com/brazil.htm


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