UOL


São Paulo, domingo, 20 de julho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

HISTÓRIA

Grupo teria perdido 8 alqueires

Loteamento ameaça área de quilombo em SP

CAROLINA FARIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA CAMPINAS

A especulação imobiliária é uma ameaça aos 124 anos de resistência e tradição de 27 famílias descendentes de escravos que vivem no quilombo Brotas, em Itatiba, o primeiro da região de Campinas a passar por um processo de reconhecimento oficial pelo governo do Estado.
Há pelo menos oito meses a comunidade quilombola sofre as consequências de fazer divisa com um loteamento de alto padrão que está sendo implantado.
Comprado em 1879 por um casal de escravos alforriados, o local onde vivem 109 descendentes tem hoje sete alqueires.
O quilombo agrupa 25 casas dispersas no terreno. As ruelas, de terra, não têm iluminação pública e, apesar de haver água encanada, a maior parte dos moradores utiliza poços. O local preserva trechos de mata atlântica e não é difícil encontrar saguis e jacus nas árvores. Os moradores dependem da cidade para trabalhar.
Segundo o Itesp (Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo), que faz um minucioso levantamento documental e do terreno para o processo de reconhecimento, a comunidade pode ter perdido oito alqueires da área.
"Esse loteamento está no limite da área [do quilombo]. Se comprovarmos que o terreno dos quilombolas, por direito, é maior do que esses sete alqueires, a área foi invadida pelo empreendimento", afirmou a antropóloga Patrícia Scalli dos Santos, 33, do Itesp.
Os proprietários do empreendimento afirmaram que o loteamento existe desde 1976 e que desconhecem que possam estar invadindo parte do quilombo. Dizem ainda ter o aval da prefeitura.
A Prefeitura de Itatiba informou que existe um projeto aprovado e que desconhece se houve invasão, mas irá fiscalizar a divisa.
No Estado há 15 áreas reconhecidas como quilombo, outras cinco em processo de reconhecimento e 15 já identificadas. Cerca de 1.100 famílias habitam essas áreas, que começaram a ser mapeadas e identificados pelo Itesp em 1998.
Em todo Brasil existem 743 quilombos certificados pela União, porém, a estimativa é que o país abrigue 2.000 comunidades.
O processo de reconhecimento pelo Itesp garante aos quilombolas a posse permanente da terra, além de serviços assistenciais.
Uma das tradições mantidas até hoje no quilombo Brotas são as sessões de umbanda, realizadas no terreiro em uma das 25 casas.
Além do problema da suposta invasão, os moradores da comunidade temem pelos mananciais, que estão sendo assoreados pela terra vinda do loteamento. Os córregos, que já foram a única fonte de abastecimento da comunidade, estão praticamente secos.

Texto Anterior: Gilberto Dimenstein: Homem é o sexo frágil
Próximo Texto: Inverno: Lojistas antecipam promoções para queimar estoques
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.