São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 2001

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MULHER MARAVILHA

Juliana Dornelles Borges,22, diz que usufrui dos "avanços científicos" para alcançar o seu "aperfeiçoamento"

Gaúcha de "19 plásticas" quer ser miss Brasil

Flávio Florido/Folha Imagem
Juliana Borges,22, miss Rio Grande do Sul 2001, que alardeia ter feito 19 plásticas para participar do concurso Miss Brasil



ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

Ela galgou recentemente a mídia como "a miss das 19 plásticas". Hasteou o inusitado título em revistas semanais e na TV.
Chama-se Juliana Dornelles Borges. Tão gaúcha quanto as tops Shirley Mallman e Gisele Bündchen, tem 22 anos, os olhos verdes, os cabelos escuros, 1m80 de altura e pernas longuíssimas.
É mesmo miss. Mais precisamente, miss Rio Grande do Sul, honraria que conquistou há três meses. Em março, vai participar do Miss Brasil. Se ganhar, seguirá para Porto Rico, onde concorrerá à coroa de Miss Universo.
Plásticas, de fato as fez. Entre dezembro e as primeiras semanas de janeiro, entregou-se a uma porção de intervenções, que lhe reduziram o peso, afinaram a cintura, avolumaram os seios e modificaram levemente o rosto (veja quadro à direita).
Hoje, portanto, integra o time das misses turbinadas -escasso no país, mas pródigo em outras searas da América Latina, sobretudo a Venezuela. Lá, raramente se encontra uma "rainha da beleza" que não enfrentou o bisturi. O artifício, em geral, compensa: as venezuelanas levam a maioria dos prêmios internacionais.
Em contrapartida, no ano passado, das 27 finalistas que disputaram o Miss Brasil, apenas cinco apelaram para recauchutagens estéticas. Nenhuma venceu.
Mais difícil do que garimpar uma venezuelana sem plástica, é saber exatamente quantas intervenções Juliana sofreu. O empresário da moça, Evandro Hazzy, e o cirurgião que a acompanha, Almir Moojen Nácul, alardeiam 19.
Somam o número de procedimentos médicos já realizados. Dessa maneira, um implante de silicone em cada seio representa duas operações. Uma lipoaspiração nos lados direito e esquerdo da cintura significa outras duas, e assim por diante. Contabilizam, também, uma alteração no nariz que Juliana ainda não fez -nem pretende fazer, apesar das recomendações do doutor Almir.
A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica discorda dos cálculos. "A praxe é contar as intervenções por região anatômica e não por procedimento médico", diz o presidente da entidade, Luiz Carlos Garcia. Tal critério rebaixa a gaúcha à condição de "miss das dez plásticas" -de qualquer modo, recorde para os padrões locais.
Por que dez viram 19? A própria Juliana explica: "Tem um pouquinho de marketing nisso". Marketing que busca reavivar um tipo de concurso há muito tempo desacreditado por aqui. O prestígio das misses -alto durante as décadas de 50, 60 e 70- despencou com a ascensão das modelos.
Alheio à decadência, Evandro Hazzy, 30, mantém em Porto Alegre uma escola que orienta jovens interessadas na competição. Definindo-se como "missólogo", é um entusiasta das plásticas. "A mulher nasce bela, mas não perfeita", argumenta. "Só a cirurgia estética conduz à perfeição."

Folha - Você já se considerava bonita antes de virar miss gaúcha?
Juliana Dornelles Borges -
Não gosto de dizer que sim, mas me considerava. Caso contrário, não me inscreveria em um concurso de beleza, né?

Folha - Então por que você resolveu fazer tantas plásticas?
Juliana -
Porque há sempre algo no corpo que incomoda. Nem as misses se sentem perfeitas.

Folha - Não?
Juliana -
Claro que não. A barriga, por exemplo. Qualquer pessoa, em sã consciência, deseja tirar uma gordurinha do abdômen. Desconheço mulher que não reclame: "Ai, minha barriga!". E os seios? Achava os meus pequenos demais. Sou também modelo, e toda modelo tem peitinhos de nada. Queria aumentá-los. Já as orelhas... Bem, as minhas estavam meio abertinhas. Eu não chegava a parecer um Dumbo, mas quase. Era um filhotinho. Enquanto trabalhava apenas como modelo, o defeito não me importunava, porque deixava os cabelos soltos. Só que as misses precisam usar coque. Prendem o cabelo para colocar a coroa. Entendeu? Se não tomasse providências, minhas orelhas ficariam maiores que a coroa.

Folha - E o rosto? O que havia de errado nele?
Juliana -
Até ganhar o concurso, não notava as imperfeições de minha cara. Se tu observa uma pessoa na rua, pode comentar: "É gorda, é magra". Mas dificilmente diz: "Nossa, esse sujeito tem as maçãs do rosto muito desproporcionais!". Os leigos ignoram detalhes assim. Já os médicos -que estudam- batem os olhos e logo apontam o que está fora de lugar. O doutor Almir percebeu os problemas durante a consulta e me mostrou que valia a pena mexer. O Evandro, meu empresário, também me incentivou -ele próprio passou por oito plásticas no rosto. Acabei me animando.

Folha - Os resultados a deixaram satisfeita?
Juliana -
Bastante. Adorei todas as plásticas. Uma maravilha.

Folha - Quantas intervenções você fez? Dezenove?
Juliana -
Cada hora sai um número. Já publicaram 16, 19, 20. Tem um pouquinho de marketing nisso, sabe? Não acho que fiz tantas intervenções como dizem. O doutor calcula assim: "Pus silicone no seio esquerdo e no direito. São duas plásticas. Lipoaspirei a cintura do lado direito e do lado esquerdo. São mais duas". Uma conta esquisita... Para mim, colocar silicone nos seios é uma plástica, não duas. O mesmo no caso da cintura. Tu já viu alguém mexer em um peito e não alterar o outro? Tirar gordura de um lado e não tirar do outro?

Folha - Como você encara o argumento, muito comum, de que as misses, quando fazem plástica, tornam-se antinaturais e, portanto, não deveriam mais disputar os concursos de beleza?
Juliana -
Antinaturais? E daí? A humanidade inventou a tecnologia para que todos a utilizem. É natural tu estar no Brasil e conversar pelo celular com um amigo que vive no Japão? Não é, mas ninguém questiona. Só porque sou miss não posso usufruir dos avanços científicos? Sem mencionar que também sou mulher e tenho as minhas vaidades. Gostaria que as pessoas superassem preconceitos dessa natureza. Ser miss é o meu trabalho. A plástica serve como um aperfeiçoamento. Os médicos, os advogados, os jornalistas não frequentam cursos de especialização? Então... As misses fazem plásticas.

Folha - Nem todas.
Juliana -
É verdade, mas há várias que fazem e não revelam. Outro dia, encontrei uma ex-miss Brasil. Ela condenou as plásticas. Explicou que, para uma miss, a cultura e a boa oratória são mais importantes do que a exuberância física. Respondi: "Até chegar à final do concurso, quando foi que tu abriu a boca? Alguém te pediu que falasse durante as eliminatórias? Não, porque somente as finalistas é que se submetem àquelas entrevistas públicas. Nenhuma menina atinge a última etapa se não exibir um belo corpo".

Folha - Seu empresário costuma afirmar que recomenda plástica às candidatas por pretender torná-las perfeitas. Você agora se considera perfeita?
Juliana -
Só se fosse maluca me julgaria perfeita. Estou é mais segura, mais confiante. Sinto-me tranquila para enfrentar aqueles mulherões cheios de curvas. Não poderia disputar o Miss Brasil com peitinhos de modelo. Iria ficar em desvantagem. O Evandro me ensinou um negócio fundamental. Ele diz: "Nosso país é reconhecidamente enorme e repleto de moças lindas. Acontece que vai mal no Miss Universo. Por quê? O que as venezuelanas, as colombianas e as indianas têm que nós não temos? Cirurgia plástica".

Folha - Em nenhum momento você ficou com medo de sofrer tantas intervenções?
Juliana -
Gozado... O medo não passava por minha cabeça. Mas agora que tudo terminou vi que corri um certo risco.

Folha - Faria novas plásticas?
Juliana -
Se houvesse necessidade profissional, sim. Só que, antes, pensaria muito. Não iria mais na ingenuidade.

Folha - Seu médico acha que você ainda precisa fazer uma plástica no nariz.
Juliana -
No nariz? Será? Creio que não. Chega de plástica.


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