São Paulo, domingo, 21 de fevereiro de 2010

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ANÁLISE

Sem continuidade, método perde eficácia

No afã de superar baixos índices de alfabetização, Estados adotam métodos aligeirados que comprometem a qualidade e a relevância da aprendizagem

MOACIR GADOTTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

O "Documento de Incidência da Sociedade Civil", preparado pelo Conselho Internacional de Educação de Adultos e discutido na 4ª Conferência Internacional de Educação de Adultos da Unesco, realizada em Belém, no início de dezembro de 2009, fez um apelo aos Estados "para superar e ir além das iniciativas baseadas em alfabetização a curto prazo e campanhas de pós-alfabetização".
No afã de superar baixos índices de alfabetização, Estados vêm adotando métodos aligeirados que comprometem a qualidade e a relevância da aprendizagem. As políticas devem ser articuladas no marco da aprendizagem ao longo de toda a vida. Sem políticas estruturantes de longo prazo, intersetoriais e integrais, não conseguiremos eliminar o analfabetismo. Os promotores do chamado método cubano "Yo, sí puedo" (Sim, eu posso) sustentam que podem alfabetizar em 35 dias. Como um processo de alfabetização intensivo, ele se utiliza de cartilhas e é marcadamente instrucionista. Podemos reconhecer a sua eficácia, mas não podemos deixar de apontar, também, suas limitações pedagógicas. A avaliação, por exemplo, não pode se constituir apenas de uma prova final ou da cópia de uma carta.
Como um instrumento inicial de promoção da alfabetização, ele pode ter efeitos positivos. Contudo, sem uma continuidade, esse método, a médio prazo, perde a eficácia inicial. As campanhas gerais, notadamente com voluntários e na base de muita mídia, desconsideram os diferentes contextos regionais e a diversidade cultural dos aprendizes. A utilização de novas tecnologias não deve quebrar a relação pedagógica. Nada substitui o alfabetizador.
A alfabetização é multifacetada. Não há uma só alfabetização como não há nenhum método milagroso. Existem várias alfabetizações: digital, cívica, ecológica, política... Há conhecimentos sensíveis, técnicos, simbólicos. O combate ao analfabetismo não se reduz à política de escolha de um método. A educação de adultos, a começar pela alfabetização, é um direito que deve ser garantido a todos e com qualidade.

MOACIR GADOTTI é professor da Faculdade de Educação da USP e diretor do Instituto Paulo Freire



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