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População teme, mas não deixa local
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIO
Zeni Melo Ferreira, 35, nasceu e
foi criada na Cidade dos Meninos.
Casou-se e hoje tem três filhos,
Vinícius, 13, Lucas, 5, e Letícia, 1
ano e sete meses. Apesar do medo
do resultado dos testes, ela não sabe se quer sair de lá. Mora numa
casa bem parecida com um sítio.
"Aqui é muito bom de morar,
muito tranqüilo. O Ministério da
Saúde diz que são só quatro áreas
contaminadas aqui dentro. O que
eu quero mesmo é o resultado dos
meus exames de saúde. Se estou
contaminada, quero saber. Tenho
direito de saber", afirmou.
O teste, segundo o epidemiologista Sérgio Koifman, será entregue a partir do próximo dia 15.
"Está marcada uma reunião com
os moradores para apresentarmos o quadro geral. A partir daí,
cada um vai receber seu exame,
com orientações para que sejam
encaminhados para tratamento,
se for necessário", disse.
O tratamento será feito, a princípio, no PSF (Posto de Saúde da
Família), que existe dentro da Cidade dos Meninos. Mas o Inca
(Instituto Nacional do Câncer) será o hospital base para tratamentos mais complexos.
Zeni se assusta em saber que o
Inca será acionado. Ela, de cabeça,
conta quase 20 moradores que
morreram de câncer nesse tempo
em que mora lá. "Mas nem todos
devem estar relacionados à contaminação", espera.
Esse é um assunto que divide os
moradores da Cidade dos Meninos. A maior parte, talvez por vergonha, não fala sobre sintomas de
doenças. Um morador, que pediu
para não ser identificado, afirmou
que quer sair dali. Espera apenas
o projeto de lei que prevê indenização ser aprovado.
"Sei que minha saúde está em
risco. Aqui temos muitos casos de
aborto espontâneo, câncer e
doenças neurológicas. As pessoas
não querem sair porque não pagam para morar, aqui é área federal", afirmou ele, que está há mais
de 40 anos na área.
O presidente da Associação de
Moradores, Adriano de Lima, 56,
também não gostaria de sair. "Se
tiver áreas que não estão contaminadas, gostaria de ficar. Vim para
cá ainda no internato, aos 16 anos,
aprender um ofício. Depois, voltei
como diretor de um dos institutos. Eu não entrego os pontos.
Mas também não quero prejudicar a saúde das minhas filhas [ele
tem duas]. Vamos esgotar as possibilidades", afirmou. Lima reclama da pequena indenização prevista para os moradores: R$ 50
mil por família.
Na área onde moram, há placas
grandes onde se lê que é proibido
tirar água de poço e ter animais.
No dia em que a Folha esteve lá,
dezenas de bois e vacas, além de
cavalos, pastavam na área contaminada por organoclorados, que
devido à baixa biodegrabilidade,
acumula-se na cadeia alimentar,
principalmente em alimentos de
origem animal, como carne, ovos
e leite.
(TF)
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