São Paulo, sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

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ANÁLISE

Em 77 anos, nunca houve janeiro tão chuvoso

Causa é grande quantidade de umidade proveniente da Amazônia, associada ao El Niño

AUGUSTO JOSÉ PEREIRA FILHO
ESPECIAL PARA A FOLHA

OS REGISTROS de chuva na cidade de São Paulo indicam que este mês já é o janeiro mais chuvoso em 77 anos -desde que as medições começaram a ser feitas no Parque do Estado-, com um total parcial, até a manhã de ontem, de 452 mm de chuva. Este mês irá superar o recorde mensal absoluto de chuva, que foi registrado em março de 1991, quando chegou a chover 471 mm. As chuvas excepcionais neste início de ano resultaram em inundações, alagamentos, enchentes, deslizamentos, quedas de árvores etc. e superam a média anual de 17 eventos. Desde julho de 2009, está chovendo acima da média. O ano fechou com um total anual de 1.885 mm, o 5º maior volume de chuva da história. As chuvas desde então foram produzidas por uma grande quantidade de umidade proveniente da Amazônia, associada ao padrão de circulação do fenômeno El Niño, que provoca mais chuvas nas regiões Sul e Sudeste e menos chuvas no Norte e Nordeste.
O ano de 2010 começou com mais umidade no solo e na atmosfera. Aqui na região metropolitana de São Paulo, os eventos de chuva têm sido produzidos pela alta umidade originária da Amazônia, pela umidade excedente regional e pela umidade proveniente da brisa marítima local. Além disso, a superfície do oceano Atlântico está mais quente do que o normal, o que aumenta a evaporação para a atmosfera. Essas fontes de umidade são, então, locais (brisa marítima), continental (por exemplo, da Amazônia) e oceânicas, trazidas pela circulação da Alta do Atlântico Sul, a fonte de umidade mais importante da América do Sul.
A temperatura do ar mais alta permite maior entranhamento de umidade no ar, que se torna mais instável. Por causa das chuvas, a atmosfera fica mais limpa, permitindo uma incidência de radiação solar maior, mais aquecimento do ar (em particular em áreas urbanas) e mais movimento vertical ascendente, que produz as nuvens e tempestades. As tempestades sobre a região metropolitana de São Paulo têm chegado a altitudes de mais de 18 km, similar ao que ocorre na região da Amazônia.
Há, portanto, necessidade de atenção redobrada com as enchentes, inundações, deslizamentos e outros impactos adversos dessas intensas tempestades. Os solos estão saturados de umidade ou próximos da saturação, o que poderá resultar em mais alagamentos etc. Essa conjunção de fatores locais, regionais, continentais e hemisféricos tem produzido muitas chuvas aqui no Sul e Sudeste do Brasil. Concomitantemente, há outras regiões no hemisfério Sul onde há falta de chuva e secas. O período chuvoso no Sudeste vai até o mês de março, e mais eventos de chuva são esperados.


Este mês irá superar o recorde mensal absoluto de chuva, que foi registrado em março de 1991


AUGUSTO JOSÉ PEREIRA FILHO é professor associado do Departamento de Ciências Atmosféricas da USP e especialista em hidrometeorologia e climatologia urbana



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