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CORRUPÇÃO
Empresário paga "multa" na sede do órgão, com cheque pré-datado, que deve ser trocado por dinheiro no vencimento
Esquema no DNER cobra propina em parcelas para liberar veículo irregular
ARIEL KOSTMAN
da Redação
A rede de corrupção que atua em
São Paulo não se restringe à administração municipal. Na sede paulista do DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem),
órgão do governo federal, funciona um esquema de cobrança de
propina com a participação de fiscais e funcionários graduados.
A Folha presenciou, e gravou, a
negociação entre um empresário,
que teve dois ônibus irregulares de
fretamento apreendidos, e funcionários do DNER na sede na Vila
Maria (zona norte de São Paulo).
E.O., que prefere não ser identificado, teve o primeiro ônibus
apreendido em novembro de 98
por um fiscal do DNER. Convocado para tratar da liberação do veículo, foi informado de que teria de
pagar uma multa de R$ 1.288,77.
Em conversa com o chefe de operações do DNER em São Paulo, engenheiro Henrique Schiller, E.O.
recebeu a proposta de parcelar o
pagamento em três vezes, com
cheques pré-datados. Entretanto,
o valor não deveria ser pago no
banco, mas entregue ao chefe do
setor de transportes, José Mário
Cendretti. O veículo foi liberado.
O mais inusitado é que, como
comprovante do pagamento, E.O.
recebeu o seguinte recibo: "Recebemos do sr. E.O. (no recibo, consta o nome completo), referente a
processo de multa e apreensão,
três cheques pré-datados. Assinado, E.O." Ou seja, o empresário
consta no "recibo" como pagante e
como recebedor. Não há carimbo
ou timbre do DNER, apenas o brasão da República com a inscrição
Serviço Público Federal.
Na data de vencimento, E.O.
comparecia ao órgão e os trocava
por dinheiro. A operação foi feita
duas vezes. Na última parcela, de
fevereiro, ele alegou dificuldades
financeiras e não trocou o cheque.
Em abril, outro ônibus da empresa foi apreendido. Acompanhado pela Folha, E.O. retornou
ao DNER para negociar o resgate
do último cheque e tratar da liberação do segundo veículo. Recebido por Cendretti, ele foi encaminhado a uma outra funcionária para trocar o cheque por dinheiro.
A funcionária abriu uma agenda,
na qual estavam diversos cheques,
e retirou o de E.O, que pagou R$
429,60 em dinheiro. Cendretti disse que depois mandaria alguém
pagar o valor no banco.
Mas o documento de liberação,
no qual consta que as multas já estavam quitadas, já havia sido emitido em novembro de 98.
Quanto ao outro ônibus apreendido, E.O. foi informado de que
poderia novamente parcelar o débito, mas que a negociação teria
que ser feita com Schiller, o chefe
de operações do DNER.
No dia seguinte, em conversa
gravada pelo telefone, Schiller disse que poderia "dividir a multa".
E.O. voltou ao DNER, e a operação
foi repetida. Mais três cheques pré-datados foram entregues e o veículo foi liberado. Novamente, ele recebeu um documento de liberação
do veículo, no qual as multas constam como já quitadas. Desta vez, o
documento traz, além da assinatura de Schiller, a do chefe do DNER
em São Paulo, Deuzedir Martins.
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