São Paulo, segunda-feira, 22 de maio de 2000


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VIOLÊNCIA
Crime organizado continua atuando em áreas beneficiadas por programa social da Prefeitura do Rio de Janeiro

Tráfico desafia governo e fica em favelas

ANTONIO CARLOS DE FARIA
DA SUCURSAL DO RIO

O Favela Bairro, que a Prefeitura do Rio de Janeiro anuncia como o maior projeto social do mundo, não eliminou a presença das quadrilhas de traficantes. O projeto é recomendado pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para aplicação em áreas carentes de países do Terceiro Mundo.
O banco financiou a primeira fase do Favela Bairro e, no último mês de março, fechou contrato com a prefeitura para uma nova etapa de obras. A implantação do Favela Bairro consumiu cerca de US$ 300 milhões, em iniciativas que afetaram 76 mil pessoas.
Outras obras, que estão em mais 46 favelas, devem ser inauguradas até o final do ano pelo prefeito Luiz Paulo Conde, que tenta a reeleição. Esse pacote inclui áreas onde moram 221 mil pessoas.
A Folha constatou a ação do tráfico, inclusive com a permanência de grupos altamente armados, em pelo menos 20 das 27 favelas onde a prefeitura informa ter finalizado as obras.
Nas favelas onde não há tráfico (Quinta do Caju, Floresta da Barra da Tijuca, Canal das Taxas, Parque Conquista, Praia da Rosa, Inácio Dias e Agrícola), essa era uma situação já existente antes do projeto.
O Favela Bairro, que tem o objetivo de integrar as favelas à cidade por meio de ações urbanísticas e sociais, é visto como "um instrumento sério, forte, decisivo" para o controle do tráfico, segundo o prefeito Luiz Paulo Conde.
Ele afirma que melhores resultados no combate às quadrilhas de traficantes dependem da integração de várias ações e principalmente de um investimento maior no policiamento.
Nas 27 favelas onde o projeto terminou, ainda são restritas as ações para geração de emprego, outro dos objetivos do programa.
De nove cooperativas organizadas pela Secretaria Municipal do Trabalho, só duas estão nessas favelas. De 27 salas para cursos de informática, 12 estão nelas. As demais cooperativas e salas estão em outras favelas, nas quais as obras ainda continuam.
Onde o projeto terminou, a prefeitura privilegiou as ações urbanísticas, ou seja, obras de saneamento, rede de água, iluminação pública, contenção de encostas, reflorestamento, calçamento e construção de ruas, praças, áreas de lazer e práticas esportivas.
As mudanças urbanísticas, que a prefeitura considera como indutoras das transformações socioeconômicas nas favelas, são elogiadas por moradores de áreas como o Parque Royal, onde os efeitos que causaram são visíveis.
Mas também sofrem críticas em favelas, como o Borel, por problemas de execução e pela qualidade do material empregado.

Traficantes
Por coincidência ou não, o Borel, na Tijuca (zona norte), é uma das favelas onde os traficantes mantêm presença ostensiva, agindo como força paramilitar. Já no Parque Royal, na Ilha do Governador, na zona norte, a ação dos traficantes passou a ser discreta.
A avaliação de que a presença das quadrilhas de traficantes ainda é forte nas áreas do Favela Bairro é compartilhada pelo comandante da Guarda Municipal, Paulo Cesar Amendola, responsável pela estratégia de segurança do projeto. Mas ele enfatiza que o projeto deu resultados "fantásticos" onde a ação dos traficantes deixou de ser ostensiva.
Amendola diz que determinou uma investigação por meio de agentes da Guarda Municipal sobre o poderio das quadrilhas.
A investigação, ainda não concluída, foi iniciada depois que a Folha noticiou, em abril, que a Polícia Militar montou uma operação para garantir a continuidade das obras do projeto na Chácara Del Castilho (zona oeste).
Na ocasião, operários estavam sendo ameaçados pelos traficantes locais, que queriam impedir a construção de uma nova rua.
No início deste mês, tiroteios entre traficantes paralisaram as obras do Favela Bairro no morro dos Prazeres, em Santa Teresa (região central). Engenheiros e arquitetos relataram que já haviam sido ameaçados em pelo menos três ocasiões anteriores.
O grupo que tentou invadir o morro dos Prazeres tinha entre seus membros traficantes que vieram da favela da Serrinha, em Madureira (zona norte).
A Serrinha é um dos lugares onde foi iniciado um programa de geração de renda, com uma cooperativa de costureiras, mas a experiência não teve continuidade.
Para Alba Zaluar, uma das principais estudiosas das favelas e comunidades pobres do Rio, o tráfico permanece porque falta uma ação conjunta dos vários níveis de governo e da sociedade. "O Favela Bairro é muito bom, tem que ser feito, mas é insuficiente", afirma.


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