São Paulo, domingo, 22 de maio de 2005

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CIRURGIA FISCAL

Com dívida acumulada de R$ 50 milhões, o pronto-socorro reduziu pela metade o número de atendimentos

Crise esvazia o maior hospital da zona leste

LUÍSA BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Cadeiras vazias na entrada do pronto-socorro do hospital filantrópico Santa Marcelina, o maior da zona leste de São Paulo, mostram os efeitos da crise pela qual passa a entidade. O setor, que recebia cerca de 24 mil pessoas por mês, reduziu o número pela metade após restringir o atendimento, em dezembro do ano passado, devido à falta de verbas.
Com um déficit mensal de R$ 1,5 milhão e uma dívida acumulada de R$ 50 milhões, o hospital é a unidade filantrópica (sem fins lucrativos) em situação financeira mais grave no Estado. Cartazes espalhados pelo local explicam a mudança aos pacientes. "O Hospital Santa Marcelina só atenderá em caso de urgência/emergência por falta de recursos", diz o aviso.
Na ortopedia, as mais de 50 cadeiras da recepção, que antes não comportavam a demanda do setor, eram mais que suficientes para abrigar a meia dúzia de pessoas que aguardavam atendimento na manhã da última sexta-feira.
No mês passado, com o agravamento da crise, o hospital desativou o serviço de fisioterapia, pois custava cinco vezes mais que a receita gerada. O serviço atendia cerca de 2.500 pessoas mensalmente. A estrutura de dez salas agora vai abrigar um setor de ortopedia para pacientes que têm planos de saúde.
A crise financeira que atinge os 2.100 hospitais filantrópicos e Santas Casas no Brasil terá mais um capítulo nesta semana quando representantes do Ministério da Saúde se reúnem com membros da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas e representantes das entidades para discutir o financiamento do sistema.
O ministério quer investir na contratualização, mecanismo no qual são fixadas metas qualitativas e quantitativas que os hospitais se comprometem a atingir e recebem um valor fixo mensal por isso. Para a confederação, o sistema é interessante.
No último encontro, em abril, a confederação propôs ao ministério um reajuste emergencial no Integrasus (programa de incentivo a hospitais filantrópicos) e nos valores fixados em tabelas pelos procedimentos, concessão de financiamento pelo BNDES com taxas subsidiadas de até 6% ao ano e renegociação dos débitos previdenciários dos hospitais.

Sem reajuste
De acordo com o presidente da confederação, Antônio Brito, há seis anos a tabela não sofre um reajuste que acompanhe o crescimento da inflação. Alguns valores estão tão defasados que mesmo um aumento de 100% seria insuficiente. Um exemplo é o valor pago pelo SUS para a realização de uma parto normal, R$ 291,15. Segundo a confederação, o procedimento custa R$ 724,20, e os convênios pagam R$ 1.800.
Para o presidente da Federação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas do Estado de São Paulo, José Reinaldo Nogueira Júnior, a falta de reajuste contradiz a Constituição Federal. "A Constituição garante o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos." Segundo ele, a federação pensa em ir à Justiça, caso não haja avanço na negociação com o ministério.
Para sair do vermelho e continuar funcionando, o Santa Marcelina pretende destinar 30% de sua capacidade a pacientes particulares e de convênio. Hoje, eles representam 15% dos atendimentos. No entanto, para a diretora técnica do hospital, irmã Giuseppina Raineri, a solução do problema é outra. "A chave do problema é a remuneração justa do serviço que se faz", declarou.
Para ser classificado como hospital filantrópico, a unidade deve destinar 60% de seus atendimento a pacientes do SUS. Segundo Brito, nem todos os hospitais conseguiriam atrair pacientes de convênios médicos para completar o restante do atendimento. "Em 56% dos municípios brasileiros, as Santas Casas e hospitais filantrópicos são o único serviço de atendimento pelo SUS".


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