São Paulo, terça-feira, 22 de agosto de 2000


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VIOLÊNCIA
Secretaria da Segurança toma decisão em reação à anifestação marcada para o dia 29, Secretaria da Segurança
Governo do Rio reage a protesto das favelas

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Líderes comunitários seguram cartaz sobre os sete anos da chacina de Vigário Geral, que serão lembrados em ato no dia 29


FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

O governo do Rio anunciou ontem que vai vigiar as manifestações conjuntas programadas por lideranças de morros e favelas contra a violência policial.
A Secretaria da Segurança considera que o tráfico está incitando essas manifestações e, por isso, decidiu também abrir 68 inquéritos para apurar a atuação do narcotráfico e a receptação de armas, identificando os envolvidos.
Serão dois inquéritos para cada área integrada de segurança pública -divisão criada pelo governo para monitorar os índices de criminalidade. A partir desta semana, todas as manifestações serão filmadas pela polícia para que os participantes e líderes sejam identificados.
Há nas favelas um movimento para sincronizar os protestos contra a violência policial. Um grande ato está programado para o dia 29 de agosto, lembrando os sete anos da chacina de Vigário Geral, quando 21 pessoas foram mortas.
A organização é da Frente de Luta Popular, um agrupamento de movimentos sociais que reúne moradores de favela, sem-terra, sem-teto e estudantes, entre outros. Dois líderes estão à frente desse movimento: André Fernandes, 29, e Antônio Carlos Gabriel, o Rumba, 46. Os dois estão organizando os moradores para protestos conjuntos, mas negam que o tráfico participe do movimento.
O secretário da Segurança Pública, Josias Quintal, disse que considerou "um desafio ao Estado" as declarações de André Fernandes e Rumba, que prometeram uma "revolução das favelas".
"Eles fazem ameaça ao Estado: "Vamos descer, vamos nos aliar aos traficantes, somos uma tribo". Esses inquéritos começam com eles também. Não acredito no poder de articulação deles, acho que esses dois não estão com essa bola, mas, já que fizeram o desafio, vamos instaurar os inquéritos."
Uma gravação em poder da polícia mostraria um suposto diálogo entre André Fernandes e a mãe do traficante Márcio Amaro de Oliveira, o Marcinho VP.
Quintal disse que manifestações pacíficas são permitidas por lei e pelo Estado. Segundo ele, a polícia vai até liberar o trânsito para a manifestação do dia 29, mas não aceitará "bagunça". "Quem protestar criminosamente será filmado e indiciado. Quem desce da comunidade para incendiar ônibus é bandido e terá que responder por esses crimes." A PM colocará 1.530 homens à disposição para ajudar na obtenção de informações para os inquéritos.
Rumba Gabriel, presidente da Associação de Moradores do Jacarezinho, reafirmou ontem que sua idéia é fazer "uma revolução" com o povo das favelas e que não se preocupa com os inquéritos.
Ele disse que a convivência com o tráfico nas favelas é inevitável, mas negou que os traficantes estejam participando do movimento. Afirmou que tem uma irmã ligada ao tráfico e foragida da Justiça, mas que isso não significa que ele também esteja envolvido.
André Fernandes foi procurado ontem pela Folha e não foi encontrado. No domingo, questionado sobre o potencial violento das manifestações, ele afirmara que a idéia é fazer protestos pacíficos.
"Mas é difícil conter o povo. A toda ação corresponde uma reação em sentido contrário. Se uma criança morre, como é que você quer que o povo fique calmo?"
Pesquisador do Iser (Instituto de Estudos da Religião), o sociólogo Ignacio Cano se disse "muito preocupado" com as declarações dos líderes comunitários e dos governantes. Cano disse que o governo não tem o direito de reprimir todas as manifestações. Ao mesmo tempo, disse temer o potencial violento dos atos e sua instrumentalização pelo tráfico.
"A situação está ficando perigosa. Os moradores das favelas têm de se organizar, mas os movimentos têm de ser sem violência e separados do tráfico, senão a repressão vai aumentar, o confronto vai aumentar", afirmou.



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