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PASQUALE CIPRO NETO
"A maioria dos atores são moradores..."
Já faz tempo que quero discutir a concordância do verbo
quando o sujeito é formado por
expressões como "A maioria",
"Boa parte", "Grande parte", "A
maior parte" etc. Os leitores vivem perguntando sobre isso.
Dia desses ouvi num noticiário
televisivo esta frase, ótima para
ilustrar a questão: "A maioria dos
atores são moradores da própria
favela". Falava-se do filme "Cidade de Deus", que acabara de estrear, no Rio de Janeiro.
Sabe-se que, se o sujeito é "A
maioria" (e não "A maioria dos
atletas", "A maioria dos deputados", "A maioria das mulheres"
etc.), o verbo deve ficar no singular: "A maioria preferiu ficar na
sala"; "A maioria quer mudanças"; "A maioria gostou do filme".
A dúvida ocorre quando termos
como "maioria" ou "parte" (e outros de mesma natureza) vêm seguidos de especificadores postos
no plural. Nesse caso, caro leitor,
o que decide a questão não é uma
regra rígida, inflexível; é o bom
senso. A escolha da forma verbal
depende basicamente do que se
quer enfatizar, ressaltar.
Em "A maioria dos jornalistas
mostrou preparo para sabatinar
o candidato", por exemplo, a opção por "mostrou" enfatiza a noção de conjunto, de grupo, representada pela palavra "maioria".
Essa é a concordância lógica, já
que é da norma geral que o verbo
concorde com o núcleo do sujeito.
Caso se optasse por "A maioria
dos jornalistas mostraram...",
dar-se-ia destaque para os formadores do grupo ("os jornalistas").
A questão fundamental é saber se
de fato há necessidade de enfatizar os formadores do grupo, já
que a concordância natural é feita com o verbo no singular. Formas como "A maioria dos eleitores compareceu" ou "Grande parte dos motoristas desconhece o
básico do básico das leis de trânsito" talvez soem mais naturais do
que "A maioria dos eleitores compareceram" ou "Grande parte dos
motoristas desconhecem...".
A coisa pode mudar de figura
quando se trata de verbos como
"ser", "estar", "ficar" etc. Com
eles, a obediência à concordância
lógica nem sempre gera bons resultados. Veja-se a frase do telejornal, citada no início deste texto
("A maioria dos atores são moradores da própria favela"). Siga-se
a concordância lógica e se chegará a isto: "A maioria dos atores é
moradora da própria favela".
Que tal? A decisão é de quem escreve ou fala, já que as duas formas ocorrem na língua padrão,
mas a opção por "é", que concorda com "maioria", impõe a necessidade de estender o critério à
concordância do predicativo
("moradora"), o que talvez soe
um tanto "estranho". Como
quem efetivamente mora são os
atores, parece que a opção por "A
maioria dos atores são moradores
da própria favela" é mais natural
do que a opção por "A maioria
dos atores é moradora...".
O que foi dito aqui a respeito de
"A maioria" se estende a "Boa
parte", "A maior parte" etc. Frases como "A maior parte dos homens examinados é portadora da infecção" ou "A maioria dos trabalhadores dessas regiões está
contaminada" talvez sejam naturalmente substituídas por "A
maior parte dos homens examinados são portadores da infecção" ou "A maioria dos trabalhadores dessas regiões estão contaminados". A escolha é sua. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail - inculta@uol.com.br
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