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MARILENE FELINTO
O factóide da atriz e o caso Gugu
A pior coisa destas eleições
não foi o sempre indigesto
horário eleitoral na TV, foi o
bombardeio imposto ao eleitor
pelo pensamento único da imprensa -a campanha ora descarada, ora mal dissimulada a favor do candidato do governo à
Presidência.
Fosse quem fosse o candidato
da oposição, essa atmosfera de
quase fraude eleitoral instituída
nas entrelinhas ou nas linhas
mesmas da imprensa seria motivo de condenação e repulsa em
países desenvolvidos, em terras de
gente menos avassalada, menos
despreparada para ler e pensar.
Mas ler jornal, assistir ao noticiário da TV, ao "Jornal Nacional" e aos demais telejornais da
Rede Globo, bem como ao reacionário "Jornal da Record", para citar alguns, transformou-se em
momento de constrangimento e
mal-estar. O "Jornal da Record"
perpetrou verdadeiras sessões de
"descarrego" toda vez que teceu
comentários sobre a candidatura
petista de Lula.
A TV Record, dos mesmos donos da igreja Universal do Reino
de Deus, transmite uma aberração chamada "sessão de descarrego" do demônio que se apoderaria do corpo de seus "fiéis". Coisa
de assustar criancinha e fazer
adultos gargalharem para não
chorar de indignação.
Pois o "Jornal da Record" segue
pela mesma linha tirânico-exploradora, aproveitando-se do poder
teológico-político do canal para
insuflar ainda mais medo supersticioso no telespectador ignorante. Devia ter por "âncora" o bispo
Edir Macedo, dono da empresa.
Daria na mesma.
Nos jornais, as fotos de José Serra apareceram com muito mais
frequência do que as de Lula, escolhidas a dedo (na tentativa de
disfarçar a falta de carisma do
peessedebista) e ocupando as páginas e os lugares nobres (as páginas ímpares e o alto das mesmas,
leitor leigo).
A capa da última edição da revista "Veja" é de um cabotinismo
e de um mau gosto burro na tentativa de demonização do PT (caricatura de um demônio com cabeça de Karl Marx). A revista
"Época", prima pobre e de personalidade mais fraca, segue no rastro, imitando-lhe o tom marrom.
A criação de factóides nunca foi
tão farta -induziu mesmo a erros grosseiros (ou de pura má-fé)
de reportagens que obrigaram órgãos de imprensa a se retratarem.
O factóide da semana foi a "repercussão" (fabricada pela mídia) do aparecimento de Regina
Duarte na propaganda de Serra.
A coisa se dividiu entre os sujeitos
que foram a público defender a
atriz e os não-sujeitos impedidos
por censura de criticar a dondoca
da Rede Globo e sua adesão ao
clima de contra-comunicação e
terror imposto ao telespectador
novelesco. Ninguém questionou a
aparição de gente de mídia nas
campanhas, ninguém se perguntou quanto eles ganham para
participar da festa promíscua
-Gugu Liberato ganhou do governo FHC todo um canal de TV,
coisa ilegal e imoral. Ninguém
ousou comparar ou lembrar a
síndrome de Marília Pera na
campanha pró-Fernando Collor.
Para não falar de como as redes
de TV se apossam, presunçosas,
das "entrevistas" com os candidatos e dos "debates" entre eles, como se o poder, na verdade, estivesse com elas. Fosse quem fosse o
candidato da oposição, essa atitude golpista da imprensa brasileira
merecia boicote de leitores e telespectadores.
"Onde? Quem? Quando? O quê?
Como? Por quê? Essas questões
que, supõe-se, deveriam estruturar toda informação, não são
nunca colocadas, porém, quando
se trata de informar... sobre a própria informação", aponta o francês Serge Halimi ("Les Nouveaux
Chiens de Garde", ed. Liber-Raisons D'Agir). É só silêncio e cinismo. Melhor fazer coluna social na
imprensa da província.
E-mail -
mfelinto@uol.com.br
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