UOL


São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brasil recebe US$ 100 mi por mês

COLUNISTA DA FOLHA

Não é apenas na adaptação que o nipo-brasileiro é um expatriado em condições diferentes da de outros integrantes da diáspora brasileira. Há o lado brilhante dessa história, para as contas do país e para muitos dos dekasseguis.
Um concentrado desse lado feliz pode ser encontrado todas as manhãs de sábado no New Kokusai Building, em pleno Marunouchi, o bairro financeiro de Tóquio.
No prédio fica a agência central do Banco do Brasil, aberta com autorização oficial em pleno sábado, porque é, em geral, o dia de folga dos dekasseguis, que o utilizam para fazer remessas para os parentes que ficaram no Brasil.
São US$ 100 milhões por mês, conta Roberto de Camillo, gerente-geral para a Ásia. Para um país que tem sérios problemas com suas contas externas, o dinheiro dos dekasseguis é uma bênção.
Do lado de fora, brilham Bito e Bita, Simone e Fernando Onoda, que ganharam o apelido porque ela comia letras da palavra bonito, reduzindo-a a Bito. A bordo de um furgão Toyota, Fernando, 34, vende pastéis a 250 ienes (cerca de US$ 2) a unidade. O casal, 14 anos de Japão, ganha o suficiente para não ter a mais remota intenção de voltar ao Brasil.
Como a de Bito e Bita, há muito mais histórias de sucesso entre os dekasseguis do que a de fracassos.
Por isso, é uma comunidade que merece tratamento não dispensado a outras espalhadas pelo mundo. A Varig, por exemplo, só no Japão oferece o cartão de fidelidade Smiles X5. Significa que os pontos obtidos pelos cinco membros de uma família podem ser somados para conseguir uma passagem grátis. Se quatro voarem de Tóquio para São Paulo, o quinto ganha a passagem. No resto do mundo, as milhas só valem para o cartão do próprio titular.
O BB oferece aos dekasseguis o "Japan Remittance Card", que permite que o portador efetue remessas de qualquer ponto do Japão para qualquer lugar do mundo, por meio dos 25 mil caixas eletrônicos do Correio.
E é de fato bastante utilizado: os dekasseguis remetem por ano, ao Brasil, em torno de US$ 1,5 bilhão.
Mas, para chegar ao sucesso, a maioria das histórias começa com a profunda agonia descrita por um pioneiro na imigração para o Japão, que nem nikkei é, o jogador de futebol Ruy Ramos.
Em depoimento ao "International Press", Ruy, 45 anos, 25 deles no Japão, contou a sua chegada:
"Fazia muito frio, às cinco e meia da tarde já estava tudo escuro. Não via ninguém na rua. Do hotel ia para o treino e do treino para o hotel. Passei uns quatro dias chorando, só queria voltar para o Brasil. Havia ali perto um estúdio onde gravavam novelas de samurai. Eu via gueixas e samurais passando por lá. Achei que o Japão fosse só aquilo".
Não era. Virou o Eldorado para Ruy, que chegou até a seleção japonesa (primeiro dos três brasileiros a jogar pelo time nacional do Japão). Hoje, aposentado do futebol, faz comerciais de TV, comentários e clínicas do esporte, dá palestras e ainda se apresenta no bar "Copa Tokyo", com o seu pagode (a música, não o templo).
Para os nikkeis que vieram depois, o Eldorado toma outra forma: os classificados de emprego do "International Press". São de 16 a 24 páginas semanais, mais do podem oferecer muitos jornais de capitais brasileiras. (CR)


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Mortes
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.