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São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 2003

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URBANIDADE

O agricultor da cidade

OPINIÕES
Na Grécia, Platão. Marcou para sempre o pensamento ocidental ao separar o corpo da alma. Mas via o corpo como "prisão" da alma. Em São Paulo, índios. No perímetro urbano vivem duas comunidades, uma no Jaraguá e outra na zona sul. Kaká Werá Jecupé vem de lá, dirige uma ONG para divulgar a cultura índia, é pajé. Já para ele o corpo é "templo" do espírito. (VINCENZO SCARPELLINI)


GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

O hobby de Hans Dieter Temp é criar hortas comunitárias na periferia da zona leste de São Paulo; seu prazer está em ver brotarem legumes e verduras onde antes havia lixo.
Mas não imaginava que o passatempo, que não tinha nenhum intuito comercial, fosse fazê-lo mudar de emprego e levar famílias a gastar menos dinheiro para se alimentar e, ao mesmo tempo, a recuperar áreas degradadas. No hobby, ele põe em prática o que aprendeu (e tinha deixado de usar) na Alemanha, onde estudou técnicas de agropecuária e política ambiental. "Vi que na Alemanha todos sabem cultivar seu alimentos. Por que não no Brasil?", indaga Hans.
Nas horas vagas, saía à procura de terrenos abandonados, entulhados de lixo. Fazia, então, uma proposta ao dono: manteria gratuitamente a área limpa desde que, em troca, pudesse cultivar a horta. Com a autorização, recrutava jovens para ajudá-lo na plantação. Não era difícil fazer o recrutamento: muitas daqueles famílias tinham vindo do campo. "No começo, era difícil, precisei usar até terra sem cheiro, havia moradores que reclamavam da terra adubada. Mas, quando viram a produção, ficaram todos surpresos."
A informação sobre um certo sujeito com nome alemão e suas hortas circulou na Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. Até que acabaram sabendo que ele era um funcionário municipal, lotado na Secretaria de Relações Internacionais, bem distante de qualquer aroma de hortaliças -mais distante ainda dos adubos.
O secretário do Meio Ambiente, Adriano Diogo, tirou Hans das etiquetas diplomáticas e convidou-o a disseminar experiências de agricultura urbana. "Vamos investir em agricultura urbana, em conjunto com centros comunitários e escolas", promete Diogo. Os cursos serão nos núcleos de educação ambiental, espalhados nos parques.
Nas suas experiências, Hans espalhou sementes e colheu aprendizado. Um dos aprendizes dele, por exemplo, resolveu aplicar seus conhecimentos numa escola municipal da periferia - a horta acabou por enriquecer a merenda escolar. "Foi um dos maiores orgulhos que já tive", comemora Hans, para quem disseminar a agricultura urbana é só uma volta às origens. Gaúcho, nasceu no campo, onde seus pais tinham um sítio -o que um dia foi uma necessidade de sobrevivência, virou hobby e, agora, política pública.

E-mail - gdimen@uol.com.br


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