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MOACYR SCLIAR
O preço da longevidade
Bordel australiano oferece desconto
para aposentados. Pode ser difícil viver apenas de aposentadoria, mas o
dono de um bordel australiano quer
melhorar a perspectiva para os pensionistas do país e para o seu negócio.
Ele espera encorajar a maior frequência de seus clientes mais velhos
oferecendo-lhes um desconto. Cerca
de 20% dos clientes de fim de semana
do bordel são homens com idade suficiente para se aposentar, disse o
empresário. "Recebemos muitos idosos, especialmente nos fins de semana. Domingo é normalmente o dia
em que os aposentados saem e relaxam", disse o dono do bordel. "Eles
vêm nos ver antes de irem aos clubes
de golfe." Mundo Online,
16.jun.2003
A notícia de um desconto
para idosos frequentadores
do bordel teve enorme repercussão, que o dono do estabelecimento tratou de aproveitar. "Em alguns lugares, como no Brasil, estão taxando os aposentados. Nós,
não. Nós só queremos melhorar a
vida dos idosos", gabava-se.
Mas logo um problema surgiu,
na pessoa de um novo frequentador. Um frequentador assíduo; vinha várias vezes por semana, o
que atribuía ao abundante uso de
Viagra. E, cada vez que vinha,
exigia o seu desconto.
O dono do bordel desconfiou.
Em primeiro lugar, o sujeito parecia muito mais jovem do que a
idade que alegava, 72 anos. É verdade que mostrava um documento de identidade para comprová-la, mas tratava-se de uma identidade estrangeira, que poderia ter
sido falsificada. Mais: os idosos
que habitualmente frequentavam o bordel, aos domingos,
saíam dali para o campo de golfe.
O homem, não. O homem ia jogar
futebol, esporte pouco apropriado
para uma pessoa de idade (verdade que era mau jogador, mas corria os 90 minutos). Pior de tudo,
conhecidos garantiam já ter visto
o sujeito em outros bordéis, sempre pedindo desconto.
O empresário resolveu investigar o novo cliente. Contratou um
detetive particular que, uma semana depois, apresentou seu relatório. O homem tinha de fato 72
anos, mas não estava aposentado; continuava trabalhando, no
bar de sua propriedade, onde tinha uma vasta clientela, em sua
maioria formada de mulheres
(várias das quais eram suas
amantes).
O dono do bordel ficou indignado. Estava sendo fraudado, o que
não podia tolerar. De modo que,
quando no domingo o homem
apareceu, lampeiro como sempre,
interpelou-o: que história era
aquela de se declarar aposentado,
quando na verdade continuava
na ativa? A princípio o homem
negou: não, não trabalhava, estava aposentado, passava o dia em
casa. Mas diante das fotos tiradas
pelo detetive, que o mostravam
no balcão do bar, teve de admitir:
sim, ainda trabalhava. E aí fez
uma inesperada confissão: na
verdade, era o trabalho que lhe
dava gosto pela vida. A inatividade não apenas deixava-o deprimido como lhe tirava todo o apetite sexual. Ou seja, só poderia frequentar o bordel se continuasse
trabalhando.
O dono do bordel ficou com pena do homem. Chegaram a um
acordo: continuava dando desconto, mas, sobre esse desconto,
incide uma taxa de 50%. É o preço que o homem paga para continuar trabalhando. O preço da
longevidade. E, claro, o preço da
tesão.
Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal.
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