São Paulo, domingo, 23 de julho de 2006

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Sonhos colocam passado em dia

Durante o sono é possível a cada indivíduo cultivar seu próprio universo de desejos, medos e bizarrices

Pesquisador afirma que sonhos podem ter evoluídos nos mamíferos como forma de gerar simulações de futuros possíveis

MARIANNE PIEMONTE
DA REVISTA

Santos, dragões, borboletas douradas, monstros alienígenas, você e/ou o Brad Pitt e/ou a Angelina Jolie sem roupa, quem sabe dividindo a cama? Existe um lugar onde tudo isso pode acontecer, às vezes ao mesmo tempo. Bem-vindo ao mundo dos sonhos, o infinito particular em que cada um cultiva seu próprio universo de desejos, medos, bizarrices e taras.
Para começar, é bom frisar que não existe sonho sem o sonhador -e isso não é uma frase de efeito. Ela significa que o sonho só pode ser avaliado a partir do histórico de quem o teve e desautoriza qualquer tentativa de interpretação generalista.
"Sonhos são o produto da reverberação fragmentária de memórias durante o sono. Seu conteúdo é derivado do contexto emocional do sonhador, que determina quais memórias são marcantes e portanto reverberam mais", diz o neurocientista brasileiro Sidarta Ribeiro, docente da Universidade de Duke, Carolina do Norte, nos EUA.
Mas, como a singularidade individual também é construída com engrenagens do coletivo, o repertório onírico da humanidade acaba compartilhando muitas convergências. "Cada grupo tem seus símbolos. Grande parte desses símbolos é apreendida ao longo da vida, através de práticas culturais comuns à coletividade, mas outra advém de instintos, de representações mentais inatas derivadas de configurações neurais geneticamente codificadas", diz o neurocientista.
É isso que forma o chamado inconsciente coletivo, termo cunhado pelo psicanalista Carl Gustav Jung (1875-1961) na esteira dos estudos iniciados por seu mentor, Sigmund Freud (1856-1939). O pai da psicanálise lançou em 1899 o "Livro dos Sonhos", no qual rejeita o caráter premonitório dos sonhos, vigente desde o primórdios, e defende a tese de que eles são na verdade a representação dos desejos reprimidos.
A teoria freudiana foi fortemente rechaçada pela ciência durante boa parte do século 20, mas o panorama mudou.
A razão da mudança é a descoberta de que, durante os sonhos, os circuitos cerebrais relacionados à busca e à obtenção de recompensas são ativados.
"Isso provavelmente ocorre porque a função dos sonhos é simular estratégias de comportamento que levem à obtenção de recompensas. Nesse sentido, a idéia de que os sonhos refletem desejos reprimidos não é absurda para a neurociência", afirma Sidarta Ribeiro.
O pesquisador diz que é provável que os sonhos tenham evoluído em mamíferos com a função de gerar simulações de futuros possíveis com base na experiência passada.


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