São Paulo, quinta-feira, 23 de agosto de 2001

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SAÚDE

Nelfinavir, do laboratório suíço Roche, que integra o coquetel de combate ao HIV, passará a ser produzido no Rio

Brasil quebra patente de remédio anti-Aids

DENISE MADUEÑO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governo brasileiro decidiu quebrar a patente do nelfinavir, medicamento que integra a lista de 12 itens do coquetel anti-Aids, depois de frustradas as negociações com o laboratório suíço Roche para reduzir seu preço.
É a primeira vez que o governo brasileiro quebra a patente de um medicamento. Nelfinavir é o princípio ativo do remédio comercializado com o nome de Viracept.
O remédio deve começar a ser produzido a partir do início do ano que vem pelo laboratório Far-Manguinhos, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), no Rio, segundo anunciou o ministro da Saúde, José Serra. A expectativa do ministro é que o preço caia em torno de 50%. O Far-Manguinhos não confirma esse prazo.
O Ministério da Saúde gasta cerca de US$ 88 milhões (R$ 220 milhões) por ano com a compra do medicamento. O valor significa um quarto dos gastos com os 12 medicamentos do coquetel anti-Aids -US$ 310 milhões anuais.
Para produzir o remédio no país, o governo brasileiro vai usar o artigo 71 da Lei de Patentes, que prevê a licença compulsória em casos de emergência, segundo Serra. O governo alega que ficaria difícil manter a distribuição gratuita com o alto custo do medicamento importado. Cada cápsula de nelfinavir custa US$ 1,07.
Segundo o Ministério da Saúde, 25 mil pacientes no Brasil, dos 100 mil que recebem o coquetel anti-Aids, precisam tomar o nelfinavir.
"Está configurada uma situação de emergência. Não vou parar de dar o medicamento para as pessoas. O preço é que define a possibilidade de atendimento. Dinheiro não é clara de ovo, que a gente bate e cresce", disse Serra, pré-candidato do PSDB à Presidência da República no próximo ano.
A licença compulsória não é exclusiva. Além do Far-Manguinhos, outros laboratórios poderão fabricar o medicamento, desde que se habilitem para isso.
O ministro afirmou que o governo brasileiro pagará royalties (taxa pelo uso da patente do produto) à Roche. "Não somos contra patente, mas contra abuso."
Em fevereiro, o Brasil ameaçou quebrar a patente de dois remédios anti-Aids: efavirenz, do laboratório norte-americano Merck Sharp & Dohme, e nelfinavir.
Após negociações, Merck Sharp & Dohme e governo brasileiro chegaram a um acordo. A redução dos preços permitiu uma economia de R$ 80 milhões por ano.
"Infelizmente, o laboratório Roche não teve a mesma compreensão do Merck [Sharp & Dohme"", afirmou Serra. Se o laboratório ceder e baixar o preço, o governo brasileiro poderá rever a decisão.
Serra afirmou que também está negociando com o laboratório Novartis, que detém a patente do remédio Glivec, usado no tratamento de leucemia. Ele afirmou que o laboratório está cobrando US$ 2.400 por mês por paciente.

Far-Manguinhos
A diretora do laboratório Far-Manguinhos, Eloan Pinheiro, não quis falar em prazos para o início da produção do nelfinavir.
Ela afirmou que o processo de cópia do remédio está concluído e que o próximo passo será encaminhá-lo para teste de equivalência e aguardar a licença compulsória para fabricação.
"Na equivalência farmacêutica, o remédio passou, mas eu quero que ele tenha a mesma absorção que o do dono da patente."
Segundo Eloan, o processo para comprovar a equivalência deve demorar quatro meses. "Pode ser que a concessão da licença compulsória para fabricação demore ainda mais, pois a Roche ainda pode recorrer."
O Far-Manguinhos fabrica sete dos 12 remédios que compõem o coquetel contra a Aids.


Colaborou a Sucursal do Rio



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