São Paulo, domingo, 24 de fevereiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Procura por serviço de cremação cresce no país

No crematório da Vila Alpina, demanda dobrou

RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL

Em Porto Alegre, a aposentada Anna Maria Teixeira, 66, já deixou praticamente tudo acertado para o dia em que "vier a faltar". Ela já está pagando sua própria cremação. O serviço será prestado por um crematório particular da cidade, que dividiu o pagamento em 60 parcelas de R$ 40.
"Quando morrer, quero que minhas cinzas sejam jogadas no jardim do crematório. Uma coisinha simples e respeitosa. Não quero deixar para as pessoas o compromisso de limpar o túmulo, visitar em Finados, pagar taxas de cemitério."
A aposentada gaúcha é exemplo de um movimento recente que pode ser sentido em diversas regiões do Brasil. Aos poucos, o enterro em cemitério está deixando de ser o destino natural dos brasileiros mortos.
No Crematório da Vila Alpina, que fica em São Paulo e é o maior do país, a procura quase que dobrou ao longo dos últimos dez anos. Em 1998, o local fez cerca de 2.900 cremações. No ano passado, perto de 5.300.
Inaugurado em 1974, o Crematório da Vila Alpina foi o único do Brasil por mais de duas décadas. A demanda cresceu, e esse tipo de serviço começou a se espalhar. Os brasileiros podem hoje contratar 23 crematórios, em 11 Estados.
"O crescimento da cremação no Brasil é evidente e não tem volta", afirma Celso Jorge Caldeira, superintendente do Serviço Funerário de São Paulo.

Declaração em cartório
Para ser cremada, a pessoa precisa ter deixado uma declaração reconhecida em cartório e assinada por testemunhas. Caso isso não tenha sido feito, só parentes em primeiro grau podem autorizar a cremação.
Assim como nos sepultamentos, o corpo pode ser velado. Os crematórios oferecem ainda uma cerimônia rápida de despedida, religiosa ou não, diante do caixão. Depois, numa área à qual só funcionários têm acesso, a cremação é feita em fornos com temperaturas que ultrapassam 1.000ºC.
A queima demora cerca de duas horas, e o que resta são pedaços de ossos. Esses restos são reduzidos a pó por potentes trituradores. As famílias recebem as cinzas dentro de urnas. Algumas pessoas guardam as cinzas. Outras preferem lançá-las em algum lugar especial.
Das grandes religiões, o judaísmo e o islamismo proíbem a cremação. A Igreja Católica, que já condenou, hoje aceita esse procedimento.
Os motivos que levam à cremação são muito íntimos. Mas, de maneira geral, de acordo com especialistas, os brasileiros estão se desfazendo da impressão de que reduzir o corpo a cinzas significa apagar completamente a lembrança do ente morto.
"As pessoas estão mais flexíveis. Hoje vêem que podem fazer seus rituais mesmo sem um corpo", diz a psicóloga Maria Helena Franco, do Laboratório de Luto da PUC-SP.
"O vínculo deixa de ser físico e passa a ser simbólico. As pessoas estão trocando o túmulo pelas lembranças", acrescenta José Elias Flores Jr., do Grupo Cortel, que tem três crematórios no Rio Grande do Sul.
Três crematórios devem ser inaugurados nos próximos meses no país, segundo o Sindicato dos Cemitérios e Crematórios Particulares do Brasil. Ainda neste ano, o da Vila Alpina comprará mais dois fornos, duplicando sua capacidade.
Apesar de crescente, a cremação ainda é tímida no Brasil. Na cidade de São Paulo, segundo o Serviço Funerário Municipal, 7% dos corpos são cremados, muito longe dos 75% da Suíça e dos 98% do Japão.


Texto Anterior: Kassab veta licença maior para mães
Próximo Texto: Cinzas vão parar em anel ou até no espaço
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.