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Residência médica chega aos 30 anos com problemas
Avaliação é de Antonio Carlos Lopes, secretário-executivo da Comissão Nacional de Residência Médica e diretor no MEC
Segundo o médico, 90% das instituições que pedem mais residentes só querem ter gente para dar conta do trabalho nos ambulatórios
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A residência médica chega
aos 30 anos no Brasil com problemas que vão desde a falta de
preceptores (especialistas para
formar os residentes) até a exploração do trabalho dos residentes. Segundo Antonio Carlos Lopes, 59, secretário-executivo da Comissão Nacional de
Residência Médica e diretor do
departamento de residência
médica da Secretaria Nacional
de Ensino Superior do MEC,
90% das instituições que pedem mais vagas para residentes
só estão interessadas em ter
gente para dar conta do trabalho nos ambulatórios.
FOLHA - A residência médica chega
aos 30 anos com qualidade?
ANTONIO CARLOS LOPES - Evidentemente a qualidade da residência varia muito de um local
para o outro. Ela varia de acordo com as regiões e de uma instituição para outra. Há instituições de excelência e há outras
com problemas.
FOLHA - Quais são os principais
problemas?
LOPES - A residência depende
da presença de um preceptor,
que precisa ter habilidades, ética, atitude, informação e que
saiba ensinar pelo testemunho
da sua presença. É preciso também que haja um supervisor
experiente que idealize a metodologia do ensino da residência
e é necessário, ainda, que a instituição ofereça materiais e recursos ao residente. Fechei várias residências em Brasília
porque a luva era saquinho de
plástico, o que é inaceitável. Em
alguns locais, falta estrutura
mínima para o indivíduo ser
treinado. E há também sobrecarga grande de trabalho para o
residente. Em muitos casos, ele
vira mão-de-obra barata.
FOLHA - Os hospitais abusam do
trabalho dos residentes?
LOPES - Sim. A prova é que, se o
residente entra em greve, o
hospital fecha.
FOLHA - E por que há esse abuso?
LOPES - Constantemente há solicitação para que a gente aumente o número de vagas de residência. A maioria desses locais que pede o aumento de vagas não está preocupada com a
formação dos residentes. Eles
querem mais gente que toque o
trabalho no ambulatório, que
desafogue o serviço. Noventa
por cento de quem pede mais
vagas é porque precisa de gente
para tocar o trabalho.
FOLHA - O que um residente faz
hoje que não deveria estar fazendo?
LOPES - Ele não deveria estar
trabalhando sem preceptoria
adequada, não deveria estar tocando ambulatórios sozinhos,
por exemplo. Ele não pode ser
mão-de-obra barata, ele é aluno
e precisa ser supervisionado.
Residência médica não é tocação de serviço.
FOLHA - É difícil encontrar bons
preceptores?
LOPES - É. O preceptor não é remunerado, acabou a residência,
pode estar trabalhando e acaba
quebrando o galho como preceptor. Quando, na realidade, o
preceptor tem de estar intimamente ligado ao residente. Neste ano, estamos tentando resgatar a qualidade do preceptor.
Como não temos como pagá-lo
porque isso envolve leis trabalhistas, vamos registrá-los no
MEC. Eles passarão a ter um
certificado que deverá contar
pontos na pós-graduação e poderá servir como diferencial
em concursos.
FOLHA - Há muitos preceptores
que não são bem preparados?
LOPES - Na realidade, hoje os
preceptores são aqueles que
não têm o que fazer, não há interesse pela preceptoria.
FOLHA - Quais são os outros objetivos do MEC em relação à residência?
LOPES - Outro ponto é estabelecer um instrumento de avaliação dos programas de residência. Hoje há avaliação a cada
cinco anos, mas queremos
acompanhar isso mais de perto.
Estamos estabelecendo comissões de acompanhamento para
saber se as falhas apontadas estão sendo corrigidas. Não vamos mais esperar cinco anos
para fechar uma residência.
Antes também era possível que
um pediatra avaliasse a neurocirurgia, mas agora já há resolução que diz que a vistoria tem
de ser feita por médico da área.
FOLHA - Esse acompanhamento
não existia antes?
LOPES - Assim, contínuo, não.
As visitas de acompanhamento
passarão a existir já neste ano.
Só assim teremos médicos mais
bem formados.
FOLHA - Como estimular a residência em regiões mais distantes?
LOPES - No Acre, por exemplo,
falta cardiologista e não há residência na especialidade lá. Então pegamos quem fez residência em clínica médica no Estado [é preciso fazer essa antes] e
ele presta concurso para residência de cardiologia em outro
Estado, paga pelo governo. Formado, volta ao Acre para implantar a residência lá. É uma
forma de fixá-lo no local.
FOLHA - Mas há um contrato que o
obriga a voltar para o Acre?
LOPES - Ele faz residência onde
foi aprovado e no último ano
completa a formação no Acre.
Senão, não recebe certificado.
FOLHA - É também por conta dos
problemas na residência que há médicos malformados?
LOPES - É, porque se você faz
um curso de graduação péssimo e uma residência ruim, vai
para o mercado de que jeito?
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