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ANÁLISE
Existe uma Nova Luz para a cracolândia?
LÚCIO GOMES MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Não há como não se chocar
com a degradação urbana e humana da cracolândia. Relativamente poucas pessoas frequentam a região, além dos moradores tradicionais (sim, há muita
gente que procura morar dignamente em Santa Efigênia),
dos lojistas e de seus clientes do
vibrante setor de eletrônicos.
A pergunta óbvia: como o primeiro bairro planejado de São
Paulo, com enorme quantidade
de testemunhos arquitetônicos
de sua antiga pujança, pode
chegar a esse ponto?
São Paulo ficou décadas sem
Plano Diretor e, o que é pior,
sem qualquer esforço de planejamento sistemático. Não houve esforços para gerir a cidade
com a técnica e a cultura correspondentes ao nosso desafio metropolitano: quase 20 milhões
de habitantes, 80 km de urbanização contínua de leste a oeste!
Ao longo do século 20, a economia transformou-se drasticamente, mas a cidade não se
preparou para dar o correspondente suporte. Por omissão ou
por ação, tanto do Poder Executivo quanto do Legislativo, o
crescimento da cidade foi deixado nas mãos do "mercado".
Diferentemente do que se
propala, a degradação urbana
não foi causada só pelo transporte individual, incentivado
por decisões macroeconômicas
de industrialização a qualquer
custo, com o automóvel como
protagonista. Mais decisivos foram a verticalização descontrolada e o incentivo à obsolescência acelerada do espaço urbano
organizado, em busca de novas
áreas com baixo custo para incorporação imobiliária.
Em menos de seis décadas, as
atividades mais sofisticadas
saíram do centro histórico para
novos centros em torno da
marginal Pinheiros, passando
por República, Paulista, Faria
Lima, Berrini e Socorro.
A cada novo horizonte, uma
área urbanizada e parcialmente edificada era abandonada e
era glorificada uma nova Meca
imobiliária. Nada mais compreensível que o primeiro bairro implantado fora do centro
histórico tenha se tornado o
mais notável exemplo de degradação. Como nos outros casos,
não se olhou para trás. Abandonado, o espaço foi ocupado pelos excluídos da vida urbana.
Encontra-se em fase de consulta pública um edital para
contratação de um grande projeto urbanístico, pela prefeitura, para a região. Trata-se de
um passo importante, mas que
nasce viciado pela cultura neo-colononizada dos administradores que acreditam existir
know-how de ponta somente
nos países "desenvolvidos".
De fato, embora tendo tido
poucas reais oportunidades, é
no Brasil que estão os urbanistas com experiência em enfrentar problemas na escala de dezenas de milhões de habitantes
e com a diversidade cultural característica de São Paulo.
Pode haver uma Nova Luz.
Professor da FAU-USP e coordenador do Plano Diretor da Subprefeitura da Lapa (2003-04)
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