São Paulo, sábado, 24 de setembro de 2005

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Morador de rua não quer deixar a avenida Paulista

DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O morador de rua da avenida Paulista gosta do local onde vive. Lá, afirmam, têm segurança e condições de sobrevivência. Igrejas e associações dão comida, os vizinhos doam roupas e não há brigas entre grupos de moradores como ocorre na praça da Sé.
Eles só sairiam de lá se tivessem emprego e casa garantidos. Nada de albergue. Nenhum morador de rua da avenida quer ir para um abrigo da prefeitura porque lá há um prazo de estada.
A maioria veio do Nordeste, mais especificamente do Ceará, e tem profissão. Há office-boys, pedreiros, faxineiros e até ator. Muitos acabaram viciados em álcool e boa parte não sabe ler nem escrever direito. O perfil do morador de rua da Paulista acaba de ser revelado pela Associação Paulista Viva e divulgado para a Folha.
A assistente social da associação, Lourdes Maria Mascigrande, responsável pelo levantamento, passou o mês de agosto percorrendo a avenida e as ruas do entorno. Dos mais de cem moradores de rua que identificou, 62 quiseram responder ao seu questionário. Desses, 58 são homens e tem quem já esteja morando na região há dez anos.

 

Folha - Por que a associação resolveu fazer o levantamento?
Lourdes Mascigrande -
Queríamos conhecer a história desses moradores de rua e saber por que estão aqui para propor soluções. Descobrimos que eles não gostam dos abrigos e que na avenida conseguem sobreviver melhor.

Folha - Eles pedem esmola?
Lourdes -
Muitos tem vergonha de pedir. A maioria pede comida, não dinheiro. Mas tem muita associação que ajuda. A igreja, por exemplo, oferece almoço de terça e sexta e os vizinhos, roupas. Eles disseram que segurança e bondade é o que os faz ficar.

Folha - Esses moradores de rua praticam pequenos assaltos?
Lourdes -
De todos que ouvi, apenas um, do grupo que fica embaixo do viaduto que liga a Paulista à Doutor Arnaldo, assumiu que pratica furtos. Nesse grupo (que teve de mudar de lugar porque a prefeitura colocou uma rampa para impedir sua permanência), há 25 adolescentes, 4 adultos e 6 crianças, todos da zona sul, e a maioria cheira cola.

Folha - Há muitos usuários de drogas?
Lourdes -
Dezoito disseram usar álcool diariamente e três, maconha, cola e cocaína. Alguns não usam drogas, mas apresentam problemas mentais e têm comportamento estranho. Ficam, por exemplo, o dia todo no vão livre do Masp fingindo que lêem jornal e, à noite, dormem nas calçadas.

Folha - Colocar rampas nos locais onde ficam resolve o problema?
Lourdes -
Não, eles vão acabar encontrando outro canto. Nossa proposta é que cada região encontre uma solução. Aqui, por exemplo, os comerciantes e empresários poderiam discutir um plano de ação, talvez até propondo emprego a essas pessoas.


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