São Paulo, sábado, 24 de setembro de 2005

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LETRAS JURÍDICAS

Negativa berlinda da Polícia Federal

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

O sistema de informação da Polícia Federal, a dosagem de transmissão dos passos dos inquéritos mais "saborosos" são alguns dos elementos acrescentados ao seu dia-a-dia, para torná-la mais merecedora da atenção do povo. Há exageros condenáveis, mas é indiscutível que se trata de um organismo que inspira confiança.
A história recente da Polícia Federal justifica seu bom nome. Chefiada por policial de currículo qualificado (o delegado Paulo Lacerda), tem estado permanentemente nas manchetes, deixando as polícias civis dos Estados como que encolhidas, em um segundo plano.
Pois agora a Polícia Federal chegou à pior berlinda possível. Ladrões rasgaram seu cartaz de severidade na apuração dos delitos alheios, ao cuidarem (ou ao descuidarem) de seus próprios serviços. Alguém meteu a mão em dinheiro que estava debaixo do nariz, se assim se pode dizer, dos astros do nosso FBI. E não era pouco, lançando desconfiança sobre o próprio órgão. E, por falar em FBI, não há polícia do mundo que tenha merecido melhor acolhida nos órgãos de divulgação do que o Bureau Federal de Investigações dos Estados Unidos, desde os tempos em que era comandado por J. Edgard Hoover, incomparável estrela da entusiasmada divulgação internacional, estimulada por numerosos filmes. Hoover assustava até presidentes americanos, com a massa das informações controladas por ele. Só muito mais tarde, quando afinal afastado, se espalhou a informação negativa de seus excessos, conhecida de muitos, mas não do público, desde os anos 30 do século passado.
A Polícia Federal brasileira tem suas competências constitucionais claramente enunciadas, nos quadros da segurança pública, conforme vem escrito no artigo 144 da Constituição. É órgão permanente, organizado e mantido pela União, destinado a quatro missões básicas indicadas no parágrafo 1º do mesmo artigo. Os dois primeiros incisos atribuem aos policiais federais a apuração de delitos contra a ordem política e social, de crimes em detrimento de bens, serviços e interesses da União e mesmo de outras infrações com repercussão interestadual ou internacional. É deles a responsabilidade de prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e o contrabando. Quem viaja sempre encontra seus servidores exercendo funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras.
Assim se vê, no resumo, que as tarefas atribuídas à Polícia Federal são absolutamente incompatíveis com a ocorrência de furto ocorrido nas próprias instalações do órgão, depois de espetaculosa cobertura jornalística (evidentemente facilitada pelos próprios policiais) do encontro da dinheirama. Não se trata apenas de expor os culpados, o que pode ter ocorrido nas últimas horas, quando este comentário já estava escrito, mas de recuperar integralmente os valores furtados, pelo encontro e detenção de cada responsável.
Solução diversa da apuração integral e recuperação de cada centavo (em dólares e euros) será privilegiar a ousadia dos criminosos sobre a eficiência da polícia. Levarem o dinheiro, nas barbas da Polícia Federal é, como se dizia antigamente, "rasgar a carta de valente de seus homens". Como ficou dito, a confiança da cidadania nos policiais é o primeiro elemento de garantia de seu sucesso, na interação da sociedade com os encarregados do policiamento, em sentido amplo. É preciso retomar o caminho à credibilidade. Logo.


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