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URBANIDADE
São Paulo dos sonhos
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
Principal mentor do
plano divulgado na semana passada para orientar o crescimento de São Paulo, Jorge Wilheim conseguiu construir uma
cidade ideal, protegida do caos
do trânsito, onde é possível ir a
pé ao escritório e, em poucos minutos, voltar para almoçar em
casa -pelo menos para ele esse
paraíso urbano já é realidade.
Em seu plano, Wilheim, secretário municipal do Planejamento, expôs um modelo baseado no
ideal de que as pessoas não tenham necessidade de se movimentar tanto de automóvel. Os
bairros deveriam ser mistos, com
residências, comércio e serviços.
Busca-se repovoar o centro,
melhorando a orla ferroviária, e,
ao mesmo tempo, estabelecer
núcleos de serviços na periferia
-estimula-se, por exemplo, a
criação de ciclovias e de caminhos que interliguem parques.
"Quanto menos carros, melhor",
afirma, contrário à existência de
bairros exclusivamente residenciais, sem corredores de serviços.
Essa rara possibilidade já faz
parte de sua vida.
Quarenta anos atrás, ele se
mudou com a família para uma
vila em Perdizes, na zona oeste,
onde as crianças faziam da rua o
prolongamento da casa.
Adquiriu uma residência vizinha à sua, onde instalou o escritório de arquitetura; a mulher,
Joanna, uma psicanalista, também aproveitou a vizinhança
para montar o consultório. É a
conveniência de uma pacata cidade de interior no meio de uma
metrópole.
Mas não foi apenas o convite
para a secretaria do Planejamento que tirou seu sossego,
obrigando-o a fazer mais deslocamentos. Aquela vila serve de
microscópico exemplo dos riscos
do crescimento desordenado da
cidade. Usando artifícios legais,
uma construtora ergueu, a poucos metros da casa de Wilheim,
um imenso prédio de 21 andares,
um mostrengo arquitetônico que
mexeu com aquela paisagem interiorana e, pior, atiçou o apetite
de incorporadores, de olho na
possibilidade de adquirir imóveis nos dois lados da vila.
Há entre os vizinhos um pacto
contra a especulação imobiliária
para evitar a construção de edifícios dessas proporções; o pacto
consiste em não vender as casas.
Mas, como quase tudo em São
Paulo, corre o risco de, mais cedo
ou mais tarde, ser engolido pela
especulação. Difícil saber até
quando aquela vila, quase uma
utopia paulistana, conseguirá
resistir.
E-mail: gdimen@uol.com.br
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