|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Tudo o que consegui foi na base do choro", diz Adriana
DA REPORTAGEM LOCAL
"Na base do choro." Foi assim
que Adriana Davini, 33, conseguiu alguma atenção dos funcionários chilenos e "benefícios" como ser levada para o melhor lugar
da prisão, uma casa em meio aos
pavilhões habitada por mulheres
traficantes. A seguir, trechos do
depoimento de Adriana, que ainda hoje quase chora ao lembrar o
que passou.
Folha - Por que você foi presa?
Adriana Davini - Toda a vez que
conto essa história, fico muito incomodada. É violento ser preso
num país que você não conhece,
quando você não sabe por qual
motivo, e vai direto para a detenção sem ter feito nada. E você tenta explicar-se e é apenas um papel
para aquelas pessoas. Não é gente.
É impressionante a raiva que dá,
porque você faz de tudo, você se
desespera para tentar mostrar
que não tem nada a ver com isso.
E ter de suplicar ajuda por não ter
feito nada.
Folha - Você foi maltratada?
Adriana - Não. Fui tratada como
um papel. Eles diziam: "A culpa
não é minha. Estou cumprindo
meu dever". E eu dizia: "Mas eu
também não tenho culpa de nada,
e você pode me ajudar". Eu tinha
a toda hora que tirar aquela fachada das pessoas e dizer "Você pode
me ajudar, você trabalha com isso". E isso te bota muito no chão.
O mínimo que você espera é ser
respeitada. Ter que implorar para
ser respeitada... Tudo o que eu
consegui foi na base do choro, do
drama, de fazer as pessoas olharem para mim.
Folha - E como foi na cadeia?
Adriana - Nunca tinha entrado
numa cadeia. Não sabia como era.
Eu me assustei muito assim que
cheguei porque me trancaram
numa salinha com duas prostitutas. Um buraco. Não tinha janela,
tinha barata no chão. Um lugar
horrível... E eu achei que ficaria lá.
E ninguém me acharia naquele
buraco. Depois descobri que era a
triagem. Mas até entender isso,
você vai passando por coisas que
vão te desesperando. O país do Pinochet, você sabe da história de
repressão que teve lá... Separaram-me do Cássio...
Folha - E então?
Adriana - Na cadeia, as guardas
são meninas de 20 anos que não
sabem nada, cumprem o papel.
Aí, eu tive de chorar para uma delas. Falei que estava morrendo de
medo, que nunca tinha passado
por isso, que não tinha de estar ali.
"Ajude-me, coloque-me num lugar melhor". Aí, ela me olhou e
disse "pode deixar". Fui com as
duas prostitutas e fomos levadas
para um pavilhão, um lugar horrível, as mulheres horrorosas, lugar escuro, feio, sujo, muito sujo.
Pensei que ficaria lá, mas ela me
levou para outro lugar. No caminho, disse que era quase uma casa. Entrei, tinha um quintal, algumas presas se aproximaram e aí
descobri que aquele era o melhor
lugar da prisão. Tive sorte, porque
eu pedi aos policiais do aeroporto
que me colocassem num lugar
melhor, e eles não falaram. Então,
fui eu que consegui ficar num lugar melhor, como fui eu que consegui ser solta.
E o que você pretende fazer?
Adriana - Eu quero ser ressarcida de alguma coisa. Eu paguei
muito dinheiro, perdi viagem, fui
presa sem ter feito nada por um
erro burocrático. Alguém errou, e
eu tive de pagar por isso. É muita
injustiça. Passei maus bocados.
Traumas, fiquei sem dormir. Fiquei com medo, o mais puro medo. Meu pai quase teve um ataque
cardíaco porque a gente só tinha
um dia para resolver tudo, senão
eu ficaria o fim-de-semana inteiro
na cadeia. Estraguei tudo por não
ter feito nada. A sensação ruim é
isso: eu não fiz nada.
Folha - E o consulado brasileiro?
Adriana - Era feriado no Brasil, e
tinha uma moça muito inexperiente no plantão que só disse ao
Cássio que não tinha ninguém lá e
tinha que esperar até o dia seguinte. A sorte é que meu pai conhece
diplomatas e foi assim que o cônsul foi avisado, mas já no dia seguinte. Acho que a única participação deles foi em adiantar a minha ida ao tribunal, porque eu só
iria no dia seguinte. Se ele tivesse
sido informado no mesmo dia,
acho que poderia ter evitado minha ida para a prisão.
(FL)
Texto Anterior: Embaixada do Chile diz que lamenta fato Próximo Texto: Panorâmica: Filhotes de tigre são apresentados no Simba Safari Índice
|