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Aos 455 anos, SP valoriza árvores nativas
Secretaria do Verde planeja plantar 800 mil mudas de espécies da flora original da cidade nos próximos quatro anos
Hoje, bairros paulistanos
como Brás, Santa Cecília e
Sé têm índices de metro
quadrado de área verde por
habitante próximo do zero
OCIMARA BALMANT
DA REVISTA DA FOLHA
Nas comemorações dos 450
anos de São Paulo, a figueira do
parque Ibirapuera, espécie originária da Ásia, foi eleita pela
população a árvore-símbolo da
cidade. No aniversário de hoje,
cinco anos depois, as árvores
nativas é que estão em alta.
A Secretaria do Verde e Meio
Ambiente disse que fará o plantio de 800 mil exemplares com
DNA paulistano nos próximos
quatro anos em toda a cidade.
"Vamos plantar 200 mil árvores nativas por ano", afirmou
Eduardo Jorge, titular da pasta.
Pontos para o velho jequitibá, que resiste há mais de um
século no Trianon. Quando o
parque foi fundado, em 1892, o
jequitibá já estava lá. Com grades que o protegem e 117 anos
depois, a árvore centenária
continua no mesmo lugar.
Coisa rara. Por décadas, enquanto São Paulo não parava de
crescer, sua vegetação não parava de minguar. Uma equação
trágica refletida em números
atuais. Relatório divulgado na
última semana pela secretaria
relaciona a atual extensão da
cobertura vegetal com a expansão urbana e a verticalização
das regiões.
Enquanto o Morumbi, que
ainda preserva os quintais em
seus casarões, tem 239 m2 de
verde por habitante, no outro
extremo, estão áreas centrais
com "plantações" extensas de
prédios. O resultado é que bairros como Brás, Santa Cecília e
Sé ostentam índice de metro
quadrado de área verde por habitante próximo a zero. Nessas
regiões, há quarteirões inteiros
sem nenhuma árvore.
O verde tem levado a pior na
briga pelo espaço na calçada: as
raízes das árvores lutam no
subsolo com as redes de distribuição de água, gás e coleta de
esgoto; na superfície, os troncos rivalizam com os postes,
placas e guias rebaixadas. No
alto, as copas sofrem com a fiação telefônica e elétrica.
A consequência pode ser medida em graus. As regiões menos arborizadas converteram-se em ilhas de calor, que chegam a registrar temperaturas
até 10ºC mais altas do que as
medidas nos extremos sul e
norte da cidade, onde ficam as
reservas florestais e os grandes
reservatórios de água.
"Nessas ilhas, é preciso reestruturar o desenho urbano, inclusive com a efetiva desapropriação de espaços", afirma Patrícia Sepe, coordenadora do
grupo de indicadores ambientais da prefeitura.
A ideia é desocupar alguns
terrenos nesses bairros áridos
para a implantação de projetos
como os "parques de bolso".
"Não precisamos construir um
Ibirapuera. Em uma quadra,
pode nascer um parque", completa a geóloga.
A prefeitura não dispõe de
um levantamento dos locais a
serem desapropriados para se
tornarem parques nem dos recursos financeiros disponíveis
para esse projeto.
Cidade-fantasma
Para os ambientalistas, não
há escolha. Arborizar é questão
de sobrevivência. "No futuro,
ou teremos cidades verdes ou
cidades-fantasmas", prevê Pablo Melo Fajardo, especialista
em gestão ambiental e diretor
da ONG Tudo Verde. "Precisamos plantar, e as nativas são as
mais indicadas."
Apesar de adaptadas ao clima, mais resistentes, com potencial para atrair os pássaros e
com copas grandes, as espécies
paulistanas acabaram por se
tornar raras nas ruas da metrópole. "Do total da vegetação,
menos de 20% hoje é típica da
cidade", diz o botânico Ricardo
Cardim, da Associação dos
Amigos das Árvores de São
Paulo. "Se alguém quiser ver
uma copaíba, por exemplo, vai
ter trabalho para encontrar."
As perobas, os araribás e os
cedros, abundantes na época
pré-urbanização, também se
tornaram escassos. Boa parte
dessas madeiras de lei serviu
para construir telhados, portas
e móveis nos primeiros três séculos da cidade.
Com frutos comestíveis ou
não, as árvores exóticas predominam nas ruas paulistanas. A
espécie mais comum na cidade,
que representa 40% do total, é
a tipuana. De origem boliviana,
fez parte da arborização dos
bairros projetados pela companhia inglesa City, nos anos 1930
e 1940. Hoje, compõe a paisagem das ruas largas de algumas
regiões mais verdes, como os
Jardins e o Alto de Pinheiros.
A moda das árvores exóticas
chegou no mesmo navio em
que vieram os imigrantes, ainda no século 18.
"Eles valorizavam o que tinha na terra deles, como os jardins ingleses e franceses. Não
pensavam que tudo o que estava aqui há muito tempo deveria
ser bom", explica Ricardo.
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