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Garotos já ocupam 60% dos leitos para anorexia no HC
Em 2 meses, tratamento específico para homens já tem 16 pacientes, 6 deles internados
Psiquiatras e psicólogos também apontam aumento na procura de meninos
em consultórios; fenômeno ainda é uma incógnita
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Tradicionalmente associada
ao universo feminino, a anorexia tem atingido cada vez mais
homens. Hoje, eles ocupam
60% dos leitos da enfermaria
do Ambulim (Ambulatório de
Bulimia e Transtornos Alimentares) do Hospital das Clínicas
de São Paulo, o primeiro do país
a ter um grupo específico para
tratar anoréxicos.
Em dois meses de funcionamento, o grupo conta com 16
jovens com idade média de 18
anos em tratamento, seis deles
internados porque corriam risco de morte. Eles ocupam seis
dos dez leitos do Ambulim, onde antes só havia meninas. Em
15 anos de existência, o ambulatório só havia tido cinco casos
de anorexia masculina.
O fenômeno ainda é uma incógnita, não está restrito ao HC
e está sendo objeto de pesquisas em vários países. Especialistas em transtornos alimentares também têm registrado aumento na procura de meninos
em seus consultórios.
Entre os jovens internados
no HC, há casos dramáticos.
Aos 18 anos, 1m75 de altura, um
deles chegou ao hospital com
43 kg, um IMC (Índice de Massa Corpórea) de 14 -o esperado
é acima de 19. Antes da internação, só chupava gelo. Outro tem
histórico parecido: só comia
duas folhas de alface por dia.
Segundo os especialistas, não
há diferença entre a anorexia
feminina e a masculina: em ambos os sexos, começam uma
dieta por se acharem gordos e
daí não param de perder peso.
Quando comem, para aliviar a
culpa, provocam o vômito.
Nos homens, a perda excessiva de peso causa queda dos níveis de testosterona, perda da
libido e atrofia dos testículos.
Também pode levar a um grau
extremo da desnutrição, em
que o índice de mortalidade
chega a 15% dos casos.
Foi o medo da morte que levou o baiano Alex a procurar
ajuda no HC. Ele desenvolveu
anorexia há 11 anos, quando era
adolescente. "Cheguei a pesar
39 kg e ainda me sentia gordo."
Diagnóstico difícil
Para o psicólogo Raphael
Cangelli Filho, coordenador do
grupo de meninos no Ambulim,
o diagnóstico da anorexia em
homens tende a ser ainda mais
difícil em razão da escassez de
trabalhos científicos e do preconceito em torno do tema.
"Historicamente, os transtornos alimentares estão associados ao feminino. Muitos
profissionais da saúde não estão familiarizados com o tema e
familiares tendem a achar que a
recusa em comer é frescura."
O psiquiatra Táki Cordás,
coordenador do Ambulim, avalia que o aumento da anorexia
entre meninos se deve, principalmente, ao fato de os homens
estarem mais pressionados pela ditadura da beleza. "As grifes
internacionais estão começando a colocar não mais rapazes
musculosos para desfilar, mas
aqueles de visual andrógino,
cada vez mais magrinhos."
Já o psiquiatra Celso Garcia
Júnior, coordenador do ambulatório de transtornos alimentares da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas),
acredita que o aumento seja
mais reflexo de uma demanda
reprimida do que de uma mudança do perfil da doença.
Ele confirma, porém, que no
seu consultório particular
ocorreu um crescimento na
procura de meninos anoréxicos. No ano passado, atendeu
três casos em um período de
dois meses. Antes, nunca havia
tido esse perfil de paciente.
A mesma percepção tem a
psicóloga Paula Melin, do Nuttra (Núcleo de Transtornos Alimentares e Obesidade), no Rio
de Janeiro. Em um período de
três anos, ela viu quintuplicar a
demanda de anoréxicos.
A exemplo de Cordás, Melin
também acredita que tem crescido entre os homens a preocupação com o corpo perfeito. Ao
mesmo tempo, ao emagrecerem muito, acabam vítimas de
outro preconceito. "É comum
eles ouvirem: "Por que está tão
magro? Tá com Aids?'"
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