São Paulo, sexta-feira, 25 de março de 2005

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SURTO NO SUL

Vistorias não detectaram presença de barbeiros em regiões onde 5 pessoas já morreram

SC não encontra transmissor da doença de Chagas em canaviais

MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM FLORIANÓPOLIS E NAVEGANTES

Passada uma semana da confirmação do primeiro caso do mal de Chagas por ingestão de caldo de cana em Santa Catarina, os agentes do Ministério da Saúde e da Secretaria Estadual da Saúde ainda não conseguiram encontrar vestígios do barbeiro, o inseto vetor da doença.
Ontem, 16 técnicos em vigilância sanitária vasculharam duas propriedades em Navegantes -a 120 km de Florianópolis-, onde teria ocorrido a contaminação que provocou as cinco mortes já confirmadas, mas nada foi encontrado que pudesse levar ao protozoário causador da doença.
Segundo a Vigilância Sanitária, também foram inspecionadas as dez maiores propriedades que cultivam cana-de-açúcar próximas aos locais onde já ocorreram mortes. "Não há nenhum indício de que o barbeiro esteja alojado nessas áreas", afirmou Raquel Bitencourt, chefe do órgão.
"A única certeza que temos até agora é que a contaminação se deu pelo caldo de cana", disse o chefe de vigilância epidemiológica da Secretaria da Saúde, Luiz Antonio da Silva.
A busca pelo barbeiro ou por algum material capaz de isolar o foco de contaminação da cana-de-açúcar se concentrou nos quiosques das margens da BR-101, entre Tijucas e Joinville. A Secretaria da Saúde determinou a suspensão do comércio de caldo no Estado por tempo indeterminado.
"Vamos ficar aqui até descobrir o que aconteceu", disse o coordenador do trabalho de campo da Funasa (Fundação Nacional da Saúde), ao sair do mato, todo picado de insetos, em Navegantes. Ele escondeu o crachá e não se identificou. Uma norma adotada anteontem restringe as entrevistas ao comando da investigação. O objetivo é evitar informações conflitantes, afirmou o chefe da área epidemiológica.
A confirmação do surto levou à interdição de 616 pontos de venda de caldo, mas a Vigilância afirmou não poder garantir que todos os quiosques foram fechados. "Esse comércio é irregular e muitos desses pontos são clandestinos", disse Raquel Bitencourt. Ela também afirmou que a contaminação dos canaviais pelo barbeiro "está praticamente descartada".
A cana que abastece os quiosques de caldo sai, principalmente, de propriedades de Gaspar e Luiz Alves, cidades distantes de 30 a 60 km dos pontos de consumo.

Exames restritos
Até o meio-dia de ontem, apenas um posto municipal do centro de Florianópolis funcionou para atender aos que tomaram caldo de cana no período investigado -1º de fevereiro a 20 de março.
A Secretaria de Saúde de Florianópolis chegou a divulgar nota informando que seus postos estariam fechados, por impossibilidade de formar equipes de plantão na quinta-feira de ponto facultativo. Mas, no início da tarde, já eram quatro os pontos de coleta de sangue para exames.
Ainda assim, a coleta foi restrita a pessoas com algum sintoma da doença -febre, dores musculares, dor de cabeça, calafrios. O atendimento a casos sem sintomas foi postergado por falta de kits para exames.
Entretanto, no Rio de Janeiro, o ministro da Saúde, Humberto Costa, disse que foram enviados 50 mil kits ao Estado.
A restrição fez a aposentada Edith Ferreira dos Santos, 68, e os netos Bruno, 12, e Rafael, 16, voltarem para casa ainda preocupados. Oito membros da família tomaram caldo em 5 de março.
Num quiosque de Porto Belo, um dos proprietários, Jamir Venceslau Raulino, 46, disse que, em dias movimentados do verão, chegava a vender até 400 copos de caldo ao dia. Ontem a máquina de moer cana estava lacrada. Para ele, o surto no litoral de Santa Catarina foi orquestrado por uma multinacional de refrigerantes para combater a concorrência.


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