São Paulo, quinta-feira, 25 de agosto de 2005

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O OUTRO LADO DA RUA

Após entregar as fitas à polícia, há 3 meses, octogenária foi convencida a sair do imóvel onde morava

Aposentada está em programa de proteção

DA SUCURSAL DO RIO

A aposentada que desmantelou o tráfico na ladeira dos Tabajaras, na zona sul do Rio, foi incluída no programa federal de proteção a testemunhas e levada para fora da cidade. Seu nome é preservado pelas autoridades de segurança.
Ela entregou há três meses suas fitas à polícia. Depois, teve que negociar a venda do apartamento em que morava. De acordo com a polícia, a maior dificuldade para que fosse realizada uma operação na favela para prender os traficantes foi a resistência da aposentada em deixar seu apartamento.
"Somente quando a convencemos a deixar o imóvel e entrar no programa de proteção à testemunha é que resolvemos desmantelar a quadrilha", disse a delegada Monique Vidal, responsável pelas investigações.
"Ela não se limitava a filmar. Também jogava baldes d'água nos traficantes, mandava que saíssem dali", relata a delegada.
A polícia só agiu após o meticuloso trabalho de documentação da aposentada. O secretário de Segurança, Marcelo Itagiba, definiu a ação da senhora de 80 anos como uma "vitória da sociedade". "É uma forma de demonstrar que cada cidadão pode ajudar de alguma forma a melhorar a segurança pública na nossa cidade, no nosso Estado, no nosso país."

Perfil
A aposentada nasceu no interior de Alagoas em maio de 1925. Aos 13 anos, segundo conta, foi estuprada várias vezes pelo filho de um fazendeiro. Engravidou.
Foram meses vagando sozinha por casas de desconhecidos até ter o bebê, numa cidadezinha de Alagoas. "Voltei para casa e minha família me recebeu e cuidou de mim. Minha mãe me levou até a polícia e denunciamos o filho do fazendeiro", contou ao jornal "Extra", único que teve acesso a ela antes que entrasse no programa de proteção a testemunhas.
A aposentada perdeu a filha. "Durante toda a gravidez eu comi mal e andei muito de uma cidade para outra, tentando arrumar um lugar para trabalhar. O problema que ela teve no coração foi causado por isso. Minha filha era linda", disse ela.
Trabalhou como empregada em Recife (PE) e depois no Rio, onde voltou a estudar. "Cheguei até a antiga sétima série. Depois, fiz um curso de massoterapia."
Ela conseguiu financiar um apartamento em Copacabana, em 1967. Foi nesse imóvel que morou durante 38 anos e de onde filmou as ações de traficantes.

Operação frustrada
Cerca de cem policiais realizaram ontem uma operação na ladeira para localizar o paiol do tráfico na área. Chegaram a usar detectores de metal do Exército em busca de armas enterradas, mas nenhuma foi encontrada.
A ladeira dos Tabajaras surgiu a partir de um caminho usado por d. Pedro 2º para encurtar o percurso entre o Jardim Botânico e a região litorânea do Rio no século 19. O trecho recebeu esse nome em homenagem aos índios tabajaras que, oriundos do Maranhão, habitavam os morros de São João e da Saudade, que são cortados pela ladeira.


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