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MINHA HISTÓRIA ALEXANDRE ANDERSON
Vida vigiada
(...) Nós, pescadores, (...) sofremos processos de criminalização, ataques e prisões. (...) Dois companheiros nossos morreram nesse período
RESUMO Há dois meses
o pescador Alexandre Anderson, 40, vive sob proteção policial do programa
federal para proteção de
defensores dos direitos
humanos. Ele diz ter sofrido três atentados em razão
dos protestos que organizou contra obra da Petrobras, na baía de Guanabara. Segundo ele, as intervenções no local afetaram
a pesca em Magé, e não
houve compensação por
parte da empresa.
(...) Depoimento a
ITALO NOGUEIRA
DO RIO
Servi o Exército em 1988,
trabalhei no cais do porto do
Rio e depois como assistente
administrativo de uma empresa. Em 1998 vim morar
com meus pais na praia de
Mauá, em Magé.
Adotei a pesca como trabalho, por falta de outras oportunidades na cidade.
Nós, pescadores, começamos a sentir o efeito da presença constante de embarcações fazendo testes na baía
de Guanabara em 2003. Identificamos que haveria grandes intervenções onde pescávamos. Por isso, nos unimos.
Hoje a Ahomar [Associação Homens do Mar, que ele
preside] tem 830 associados
e participa do licenciamento
dessas obras. Noventa delas
são da Petrobras.
O projeto GNL [para transporte de gás natural, concluído em 2009] fez dutos submarinos que ligam uma refinaria ao terminal que fica no
meio da baía, num dos melhores pontos pesqueiros.
Esse projeto já nos causou
70% de queda no pescado.
Isso se agravou com o projeto
GLP [dutos para escoar gás
de cozinha]. Hoje a pesca na
região está impraticável.
Participamos das audiências públicas e alertamos para essa situação. Mesmo sabendo do impacto, o Consórcio GLP Submarino e a Petrobras não fizeram propostas.
Em 2009 iniciamos um
protesto e lançamos redes
nas áreas onde tínhamos atividades e impedimos a evolução dos dutos para o mar.
Sofremos ataques, prisões,
processos de criminalização.
A obra ficou parada por
um ano. Hoje vivenciamos o
término do projeto GLP. Dois
companheiros nossos morreram nesse período.
Um foi morto logo após
conseguirmos a interdição
do canteiro de obras do projeto GLP na praia de Mauá
[em maio de 2009]. O segundo, um dia depois de protocolar documento na Petrobras denunciando a presença de homens armados no
canteiro de obras.
Sofri a primeira ameaça
em maio de 2009. Chegando
da pesca, dois homens começaram a atirar, mas fugi. Fiquei numa comunidade na
Ilha do Governador [no Rio].
Em julho deste ano, estava
em casa quando vi dois homens circulando. Chamei a
polícia. Quando ela chegou,
houve troca de tiros.
Em setembro deste ano,
um major do GAM [Grupamento Aéreo Marítimo da PM
do Rio] esteve na sede da
Ahomar tentando me levar.
Era um sequestro, pois não
havia mandado nem acusação formal. Só não conseguiram porque havia muitos
pescadores. A partir disso tive escolta 24 horas por dia.
Não posso recuar. Estou
condenado à morte por milicianos, policiais e empresários inescrupulosos. Mudei
minha vida. Meus filhos estão longe. Só vivemos eu e a
minha mulher.
Nessa situação, não consigo mais ver os amigos. Nossa
família hoje são os policiais
do 34º Batalhão da Polícia
Militar, de Magé, que tomam
conta do nosso sono. Nossa
vida é casa, trabalho e esporadicamente ir a Brasília fazer relatórios.
Se a Petrobras não gerou
essa situação, ela tem total
responsabilidade. Se não há
fiscalização, creio que haja
ao menos omissão.
A violência está se intensificando. Isso não fica nada
bonito para a Petrobras, que
prega tanto sua responsabilidade socioambiental.
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