São Paulo, domingo, 26 de março de 2000


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CRISE NO RIO
José Muiños Piñeiro disse que nunca ouviu falar de ações criminosas do delegado Rafik Louzada
Procurador defende chefe da polícia

SERGIO TORRES
da Sucursal do Rio

O procurador-geral de Justiça do Rio, José Muiños Piñeiro Filho, defendeu o chefe de Polícia Civil do Rio, delegado Rafik Louzada, acusado de supostos enriquecimento ilícito e envolvimento com extorsões.
Piñeiro Filho, 43, disse à Folhaque, em quase duas décadas de Ministério Público, nunca ouviu falar da participação de Louzada em ações criminosas.
"Seria uma decepção para mim", afirmou o procurador-geral sobre a hipótese de ficar comprovada a culpa de Louzada.
As acusações contra o delegado partiram do antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-coordenador de Segurança do Estado.
Em dossiê, Soares relaciona o chefe de Polícia Civil à extorsão que teria sido praticada contra o traficante Lobão. Diz também que Louzada, com dinheiro sujo, teria comprado, por R$ 300 mil, uma franquia do McDonald's.
Supervisor da comissão do Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Militar que investiga a corrupção policial, Piñeiro Filho qualificou como "genéricas" e "muito diluídas" as denúncias. Leia a seguir a entrevista.

Folha - Há no Brasil muito descrédito em relação a comissões. Como se pode ter a certeza de que dessa vez é para valer?
José Muiños Piñeiro Filho -
Para que passe uma idéia de credibilidade, a comissão deve começar não criando falsas expectativas. Não podemos colocá-la como solução para todos os problemas. Seu trabalho de 60 dias não é definitivo, mas prévio. A comissão pretende trabalhar por um ano.
Não ficaremos só nos policiais citados pelo Luiz Eduardo (Soares, ex-coordenador de Segurança). Será um número bem maior. Solicitaremos extratos bancários e declarações de renda. Os que se recusarem, a idéia da comissão é solicitar à CPI do Narcotráfico. Também acionaremos os Ministérios Públicos de outros Estados, Banco Central, cartórios de notas de todo o Brasil.

Folha - Em 60 dias vocês terão como fechar a investigação?
Piñeiro Filho -
Acredito que um percentual pequeno de investigações poderá ser concretizado.

Folha - O governador Anthony Garotinho afirmou que o senhor lhe disse ser o chefe de Polícia Civil um homem probo. O senhor o considera probo?
Piñeiro Filho -
Fui procurado pelo Luiz Eduardo em 2 de março. Ele apresentou quatro denúncias, algumas contra o chefe de Polícia Civil (Rafik Louzada). Ele admitiu que eram genéricas, que traria mais dados. Disse a ele que, como promotor, há 18 anos convivo com autoridades policiais. Já me decepcionei muito. Por isso tenho que estar preparado para futuras decepções. Como promotor, atuei em casos com Rafik Louzada. Nunca nenhum colega me disse qualquer coisa, nem ouvi falar, por outras fontes, de alguma incorreção, de ser corrupto, de praticar extorsões. Seria uma decepção para mim.
Luiz Eduardo não me procurou mais. Depois de formada a comissão, o governador perguntou se era possível sugerir o afastamento de policiais citados. Disse a ele que as denúncias, apesar da gravidade, são genéricas. Isso afirmo: não há dado concreto. Não estou dizendo que não sejam reais, mas estão muito diluídas.
Com base nessas denúncias, a comissão não poderia sugerir nenhum afastamento. Porém, disse, há nomes que a comissão pode pedir transferência ou afastamento por outros fatos. Não usei a palavra probo, mas poderia tê-la usado genericamente.
Disse a ele (Garotinho) que, se pretendia politizar a questão, fica difícil uma orientação.
"Se o senhor quer uma apuração séria e quer evitar uma injustiça antecipada, vou lhe dizer o que disse ao Luiz Eduardo: todas as informações que me chegaram durante 18 anos de Ministério Público são positivas, favoráveis, de um homem correto (Louzada). A exoneração agora, com base em duas denúncias genéricas, apesar de graves, é uma decisão política."

Folha - Soares já avisou que não deporá à comissão. Em que isso prejudica a apuração?
Piñeiro Filho -
Prejudica no sentido de que ele mesmo admite a fragilidade (das denúncias). Todas elas são anônimas, algumas até tiradas dos meios de comunicação. Mas há dados concretos, tipo o intermediário dos bicheiros (teria reclamado do aumento do valor da propina que seria paga à cúpula policial). Ele ficou de me dizer quem é. Se não me indicar, fica muito difícil.

Folha - A comissão tem as 12 denúncias do Luiz Eduardo, as 101 da ouvidoria e agora a relação de todos os casos das duas corregedorias policiais. Não é muita coisa?
Piñeiro Filho -
É. Digo que é trabalho para um ano. Vamos ampliar a comissão. Peço à sociedade que não espere resultados imediatos. Talvez possamos romper a idéia de que tudo acaba em pizza. Espero não acabar em pizza.

Folha - A comissão já comprovou alguma das 12 denúncias?
Piñeiro Filho -
A comissão não tem nenhum dado concreto. Nenhuma das 12 tem, ao fim de uma semana, um indício fortalecido.

Folha - Como cidadão, o sr. se sente protegido pela polícia?
Piñeiro Filho -
Acho que o aparelho policial civil e militar precisa resgatar muito a sua credibilidade para que o cidadão passe a se sentir um pouco mais seguro.


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