São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2001

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MASSACRE DO CARANDIRU

Testemunha afirma, ao depor, que levou tiros quando pediu ajuda a policiais

PM desprezou feridos, diz ex-preso

DA REPORTAGEM LOCAL

Das sete testemunhas da acusação que prestaram depoimento ontem até as 21h, Aparecido Donizete Domingues, um dos sobreviventes do massacre, foi quem fez as afirmações mais contundentes. Disse à juíza que, em sua cela, viu sete detentos que tinham sido atingidos por disparos de PM agonizarem até morrer.
Em seu depoimento, Donizete disse que na cela, quando já tinha levado três tiros, passou no rosto sangue de seus companheiros para fingir que estava morto.
Disse que pediu socorro a dois policiais militares, mas estes, em resposta, segundo ele, deram em direção à cela uma rajada de tiros de metralhadora, dos quais dois lhe atingiram. Um dos policiais teria dito que estava ali não para socorrer, mas para matar, conforme disse a testemunha.
A juíza lhe perguntou por que ele tinha conseguido sobreviver. "É o que me pergunto até hoje", foi a resposta.
Donizete e as demais testemunhas que prestaram depoimento na tarde de ontem -Paulo Roberto de Oliveira Bororó, Luiz Alexandre de Freitas, Genivaldo Araújo dos Santos- afirmaram que não houve por parte dos detentos a intenção de entrar em confronto com a policia e que ninguém, dos presos do Pavilhão 9, estava com arma de fogo.
O advogado da defesa, Vicente Cascione, disse, em entrevista, que as testemunhas "mentiram muito". O promotor Felipe Cavalcanti disse que ficou satisfeitos com os depoimentos.

Ameaça
O detento Paulo Roberto de Oliveira Bororó disse que, na carceragem do Fórum da Barra Funda, foi ameaçado de morte por um suposto policial militar à paisana.
"Ele [o suposto policial" disse que ia dar tiro na gente", afirmou Bororó à juíza Maria Cristina Cotrofe, que preside o julgamento do coronel Ubiratan Guimarães, acusado de ser o responsável das 111 mortes do caso.
Bororó é um dos quatro presos que estavam no fórum sob a guarda da polícia civil desde quarta-feira, primeiro dia do julgamento, para depor como testemunhas.
A juíza Maria Cristina disse que, para apurar o "incidente", abriu uma sindicância, arquivando-a em seguida porque, conforme constatou, as testemunhas não se sentiram intimidadas para prestar o depoimento.
"Algum engraçadinho tentou atrapalhar o julgamento", afirmou o promotor Felipe Locke Cavalcanti, que é um dos responsáveis pela acusação.
Julia Rochester, representante da Anistia Internacional, disse que "estranhou" a ameaça de morte, porque, disse, as informações que ela tem de autoridades brasileiras são de que as testemunhas "iam ter toda a proteção".
Hoje, a partir das 9h, vão depor as três últimas testemunhas da acusação e as quatro da defesa. Os debates devem começar amanhã, quando a acusação e a defesa afirmaram que haverá "surpresas".


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