São Paulo, quarta-feira, 26 de junho de 2002

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URBANIDADE

Das prostitutas aos arquitetos

Vincenzo Scarpellini
PARANAPIACABA A estrada de ferro que liga São Paulo a esse burgo ferroviário, ainda não alcançado pela cidade que se alastra, liga São Paulo ao seu passado. A mata parece rejeitar a geometria dos trilhos.O relógio da torre até hoje é carregado à mão. O trem avança como uma agulha. Algo dissonante, de que De Chirico teria gostado, entrelaça devaneios e lembranças (VINCENZO SCARPELLINI)

GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA

Em meio a prostitutas, mendigos e drogados, a rua General Jardim, mais um entre tantos retratos da deterioração do centro, está prestes a tornar-se neste ano o pólo mais sofisticado dos arquitetos paulistanos -e, certamente, uma referência nacional. A rua vai estar para a arquitetura como a Oscar Freire está para a moda.
Está ali o premiado internacionalmente Paulo Mendes da Rocha, autor da reforma da Pinacoteca do Estado, um dos principais marcos da revitalização de São Paulo. A poucos metros dele, o escritório Piratininga, onde nasceu, pela primeira vez, o projeto de transformação do edifício Matarazzo, no viaduto do Chá, numa sede de governo; será ocupado até o final do ano pela prefeita Marta Suplicy.
Propondo-se a ser um núcleo de vanguarda do ensino de arquitetura, foi lançada nessa rua a Escola da Cidade. "Estamos num ponto estratégico onde podemos pensar, intervir e experimentar concretamente na caótica paisagem paulistana", diz Ciro Pirondi, diretor da faculdade.
Como parte do currículo da escola, os alunos serão convidados a pensar e a executar projetos no bairro, criando um showroom a céu aberto. O projeto inicial foi uma intervenção na calçada para se transformar em modelo para o bairro -parte da calçada torna-se um jardim com árvores e bancos voltados para os prédios. "Queremos irradiar a vontade de intervenção urbana por toda a cidade", anima-se Ciro.
Mudar a cidade é o plano ainda de outro vizinho da Escola da Cidade, também instalado neste ano, o Instituto Polis, que pesquisa e desenvolve políticas públicas para melhoria da cidade. Com a doação da Fundação Ford, recuperaram um prédio abandonado. "É uma feliz coincidência", diz Renato Cymbalista, arquiteto e pesquisador do Polis, alegre com a sinergia da vizinhança. O Polis vai desenvolver programas de treinamento de líderes comunitários.
Há história por trás dessa tendência. Na década de 40, foi construído, na rua General Jardim, o Instituto de Arquitetos do Brasil, que reunia, principalmente por seu restaurante, batizado de Clubinho, estrelas como Oscar Niemeyer, que projetou, nas imediações, o edifício Copam, um dos ícones da arquitetura contemporânea brasileira.
O prédio acaba de ser tombado e, em breve, passará por reformas -e volta a fazer parte de um espaço que, numa cidade caótica, se mostra como exemplo de recuperação urbana.

E-mail - gdimen@uol.com.br



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