São Paulo, sexta, 26 de junho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO
Suíça: uma proposta imoral


BEN ABRAHAM

A última proposta dos principais bancos suíços para pagar US$ 600 milhões pelos depósitos efetuados por judeus vítimas do Holocausto constitui uma clara manobra para confundir e tumultuar o direito incontestável de devolver o patrimônio apropriado pela Suíça à custa desses depositantes.
A nota conjunta dos bancos Crédit Suisse, Swiss Bank Corp e Union Bank of Switzerland, classificando a exigência do Congresso Judaico Mundial (CJM) como infundada e excessiva, pode ser considerada como imoral, uma vez que os valores oferecidos nem chegam a 15% do montante real acrescido dos respectivos juros. Conforme já descrevemos na imprensa nacional e internacional, se existisse boa vontade dos banqueiros suíços bastaria que fossem selecionados e somados os depósitos abandonados durante os últimos 57 anos para chegar aos números que representam o total da apropriação indébita por parte dos seus bancos. Uma solução simples e lógica para qualquer pessoa de bom senso, mas não para os banqueiros suíços.
Para livrar a Suíça da acusação de ser um porto de piratas, é suficiente promulgar uma lei que isente do sigilo bancário os depósitos inativos por mais de 50 anos. Um desafio para o governo do país, cuja prosperidade está na maior parte baseada na sua estrutura bancária.
Além dos depósitos judaicos de antes da guerra, existem outros bens de procedência nebulosa que em grande parte pertenciam aos judeus.
No fim da Segunda Guerra, quando a derrota nazista tornou-se evidente, o governo do 3º Reich autorizou o envio de dinheiro à Suíça para que as fortunas acumuladas pelas indústrias enriquecidas com a produção de material bélico fossem salvas. Dinheiro que futuramente serviria para a reconstrução do império nazista. A transferência desses valores para a Suíça não foi uma novidade, uma vez que, desde a colocação em prática da "solução final", os bens em moeda estrangeira roubada de judeus e ouro em forma de barras compostas por dentes e anéis derretidos eram depositadas constantemente na Suíça.
Esses valores serviam inicialmente para sustentar a organização Odessa, incumbida de proteger criminosos nazistas, propiciando-lhes refúgios seguros, notadamente na América Latina.
Assim, encobrindo-se por meio de rigoroso sigilo bancário, os banqueiros suíços, de fato, tornaram-se verdadeiros cúmplices dos crimes nazistas, da mesma maneira como são os receptadores no caso de roubos e assaltos.


Ben Abraham, 73, jornalista e escritor, é vice-presidente da Associação Mundial dos Sobreviventes do Nazismo



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.