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AMBIENTE
Temendo concentração de metano, que não existia, técnicos permitiram que substância cancerígena atingisse o ar
Ação da Cetesb em Mauá liberou gás tóxico
MELISSA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL
A Cetesb, a agência do governo
paulista responsável por zelar pela qualidade ambiental, já despejou no ar respirado pelos 7.500
moradores do Residencial Barão
de Mauá uma parte das 44 substâncias tóxicas encontradas no local, inclusive o benzeno, que é
cancerígeno. O desastre ocorreu
em 20 de abril de 2000, após a explosão na caixa-d'água do condomínio de Mauá (Grande São Paulo) que matou uma pessoa e deixou outra gravemente ferida.
Preocupados com a possibilidade de uma nova explosão, e suspeitando de que havia gás metano
no local, os técnicos da companhia optaram por deixar a tampa
da caixa-d'água entreaberta, até
que a concentração da substância
baixasse de 40% para 10%.
A informação consta do relatório da Cetesb sobre a ocorrência,
com data de 4 de maio do ano
passado, assinado pelo administrador do escritório da companhia em Santo André, Marco Antônio Lainha, e pelos técnicos ambientais Antônio Carlos Bezerra e
Ronaldo de Oliveira Silva.
"Os equipamentos (...) indicaram concentrações da ordem de
40% (...). Optou-se por manter a
ventilação natural da caixa [tampa entreaberta" a fim de evitar o
confinamento e, por conseguinte,
o aumento das concentrações (...)
foi realizado novo monitoramento na aludida câmara, sendo registrada concentração de 10%", afirma trecho do relatório.
O documento faz parte do processo sobre o caso de contaminação no subsolo do Residencial Barão de Mauá, que está sendo avaliado pelo Ministério Público.
Também consta no texto que,
desde a explosão, os técnicos da
Cetesb foram informados pelos
moradores de que o local em que
foram construídos os prédios havia sido utilizado anteriormente
para depósito de lixo industrial e
domiciliar. O terreno fora propriedade da Cofap (Companhia
Fabricadora de Peças).
Os técnicos afirmam que apenas as informações sobre resíduos
industriais fornecidas pelos moradores foram confirmadas pela
construtora SQG, responsável pelo empreendimento.
Desde que a contaminação foi
divulgada pela Cetesb, no último
dia 16, a companhia vinha afirmando que não tinha conhecimento, antes dessa data, de que o
local tivesse sido utilizado para
deposição de lixo industrial.
Embora tivessem essa informação, os técnicos suspeitaram que
os resíduos estivessem gerando
metano (gás comum em aterros
sanitários) e não se preocuparam
em analisar, de pronto, outras
substâncias que poderiam estar
sendo geradas a partir dos resíduos industriais.
Segundo o relatório, a Cetesb
chegou ao Barão de Mauá no dia
da explosão, quase cinco horas
após o acidente, quando foi chamada pelos moradores.
Os técnicos do setor de Operações de Emergência da agência teriam então inspecionado a caixa-d'água com aparelhos calibrados
segundo o LIE (limite inferior de
explosividade). Foram utilizados:
um alarme de gás combustível,
calibrado para pentano; um analisador minigás, calibrado para
metano; um monitor de vapores
orgânicos, calibrado para isobutileno; e um multi-gás-detector.
Os aparelhos, conforme o documento, mediram a concentração
de gases segundo o nível mínimo
necessário para gerar combustão.
Ou seja, os técnicos da agência
ambiental não detectaram todas
as substâncias presentes no local.
Segundo o engenheiro químico
José Possebon, pesquisador da
Fundacentro (Fundação Jorge
Duprat Figueiredo de Segurança e
Medicina do Trabalho), esses tipos de aparelhos, empregados pela Cetesb, só medem risco de explosão. Não são próprios para detectar a presença de benzeno.
"Eles tinham que ter feito uma
análise do tipo de substância que
havia ali. Se fosse apenas lixo doméstico, tudo bem, mas havia resíduo industrial. Eles não poderiam liberar as substâncias na atmosfera sem saber o que tinha ali.
Provavelmente a população ficou
exposta a isso", afirma.
Após a explosão, a Cetesb multou a SQG e exigiu que fosse feita
uma análise completa das substâncias. Decisão tardia. A própria
agência já havia depositado os vapores tóxicos na atmosfera.
A análise das substâncias só
chegaria às mãos da construtora
em agosto do ano passado, em
um relatório da empresa contratada CSD-Geoklock.
No processo, há um laudo da
Geoklock, de dezembro de 2000,
negando que houvesse metano no
subsolo do condomínio. A análise
completa só foi entregue à Cetesb
em fevereiro deste ano.
"Inicialmente, suspeitou-se da
existência do composto volátil
metano em função de alguns indícios, como presença de explosividade, ausência de odor e capacidade do mesmo de ser gerado de
forma natural. Essa possibilidade
foi levantada inclusive por técnicos da Cetesb que estiveram no
local após a ocorrência do acidente. Os resultados analíticos obtidos não apresentam compostos
de cadeias pequenas como o metano, os quais, à temperatura ambiente e pressão atmosférica apresentam-se na forma gasosa, e não
vapor", afirma o laudo.
A Geoklock sugere no parecer
que, em se tratando de substâncias nocivas à saúde (além do benzeno, há clorobenzeno e tolueno,
que são altamente tóxicos), fosse
feito um tratamento dos vapores
antes de jogá-los na atmosfera.
Após a explosão, todas as antecâmaras das caixas-d'água foram
aterradas. Isso pode ter repetido a
operação de deposição dos gases
no ar, já que os vapores presentes
no subsolo ocupam naturalmente
os espaços que estiverem vazios.
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