São Paulo, segunda-feira, 27 de maio de 2002

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EDUCAÇÃO

Ensino superior registra crescimento de 76,2%; participação dos 10% mais ricos sobe de 45,6%, em 92, para 48%, em 99

Vagas não trazem pobres à universidade

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

O sonho do brasileiro da camada mais pobre da população de chegar à universidade continuava tão distante no final da década de 90 quanto era no início dela. O período foi marcado por uma forte expansão da oferta de vagas, mas não o suficiente para aumentar a participação dos 50% mais pobres da população ou diminuir a dos 10% mais ricos.
Dados tabulados com base nas Pnads (Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílio) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), pelo sociólogo Simon Schwartzman, ex-presidente da instituição, mostram que ocorreu até uma pequena tendência de elitização do ensino superior.
Em 1992, os estudantes que pertenciam ao estrato dos 10% mais ricos da população representavam 45,6% do número de alunos matriculados no ensino superior. Em 1999, essa porcentagem aumentou para 48%.
Já a presença dos 50% mais pobres nesse nível de ensino diminuiu durante esse período. Em 1992, eles representavam 8,5%. Em 1999, eram 6,9%.
Quando se avalia a presença dos 20% mais ricos e dos 20% mais pobres, a elitização fica ainda mais evidente. Os 20% mais ricos aumentaram sua participação de 67,1% para 70,7%; os 20% mais pobres caíram de 1,3% para 0,9%.

Aumento de vagas
O fenômeno aconteceu no mesmo período em que o número de estudantes no nível superior teve aumento de 76,2%, passando de 1,433 milhão para 2,525 milhões.
Na avaliação do sociólogo Simon Schwartzman, os dados mostram que, apesar da expansão, a composição social dos estudantes não se diversificou.
A única tendência de democratização visível nos números é a de diminuição de brancos, que eram 80,1%, em 92, e passaram a ser 78,9%, em 99. "O aumento da matrícula significou a intensificação do acesso dos estratos mais altos ao ensino superior, que não era muito grande. Para as camadas sociais mais pobres, não mudou muita coisa", diz o sociólogo.
Ou seja, o ensino superior no Brasil, no começo da década de 90, era tão insuficiente para atender à demanda que nem a parcela mais rica da população tinha pleno acesso. De acordo com a Pnad de 1999, para ser considerado "10% mais rico da população" bastava um brasileiro ter renda média mensal domiciliar de R$ 4.090 no ano da pesquisa.
Para a secretária-executiva do Ministério da Educação, Maria Helena Castro, esses dados mostram que o ensino superior brasileiro precisa continuar se expandindo. "Esse resultado era esperado. Se a taxa líquida de escolarização no ensino superior é de apenas 7,5% da população, é normal que só agora os 10% mais ricos estejam entrando totalmente no sistema", afirmou Maria Helena.
De acordo com a secretária-executiva, as próximas pesquisas do IBGE relacionadas ao tema -como a tabulação avançada do Censo 2000 e a Pnad de 2001- devem começar a demonstrar uma alteração nesse quadro por causa da expansão do sistema e do aumento da oferta de cursos superiores de curta duração, como os cursos sequenciais.
O presidente do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, Paulo Alcântara Gomes, afirma que ocorreram avanços na democratização do ensino a partir da segunda metade da década de 90. Na opinião de Gomes, o problema está no fato de a expansão do ensino médio não estar sendo acompanhada pela oferta de vagas no nível superior.
"Há uma demanda de candidatos muito maior do que a oferta de vagas hoje. A expansão do ensino médio beneficiou as pessoas menos favorecidas, mas essas não têm condições de pagar um curso de uma universidade particular", diz Paulo Alcântara Gomes.

Meta pessoal
Foi por causa dessa demanda não atendida a que o presidente do conselho de reitores se refere que Jenice Martins da Silva, 20, ainda não conseguiu uma vaga no curso de história de uma universidade pública. Jenice persegue essa meta desde 2000.
No primeiro ano, ela conta que conseguiu passar no vestibular de uma universidade particular, mas não chegou a cursar o primeiro ano por falta de condições financeiras para pagar a mensalidade.
Neste ano, ela tentará conciliar o trabalho com os estudos. "Para quem não pode viver a realidade de apenas estudar para o vestibular, fica mais difícil passar para uma universidade pública", diz.
Ela conta que, de sua turma em uma escola estadual, foram poucos os que conseguiram obter uma vaga no ensino superior público. "Do pessoal mais próximo a mim, ninguém conseguiu entrar", afirma Jenice, que mora com os pais e seis irmãos em Carapicuíba (município da região metropolitana de São Paulo).


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