Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
GUERRA URBANA
Ex-secretário diz que negociou com PCC
Furukawa afirma à Folha que, durante a crise, governo permitiu que advogada visitasse líder da faccção, mas negou acordo
Ele afirma que sua saída do cargo após quase sete anos não significa uma vitória do secretário da Segurança Pública, Abreu Filho
DA REPORTAGEM LOCAL
Horas depois de deixar o comando do sistema carcerário
de São Paulo, Nagashi Furukawa afirmou à Folha que o governo estadual "negociou" com
o PCC, ao permitir a visita de
uma advogada a um dos chefes
da facção, Marcos Willians
Herbas Camacho, o Marcola.
A afirmação contradiz o discurso oficial da administração
Cláudio Lembo (PFL), que nega que tenha havido qualquer
tipo de negociação entre o Estado e a facção criminosa.
"O Estado não cedeu. Mas
decidiu que seria oportuno
permitir que a advogada visitasse o preso [Marcola] e confirmasse que ele não foi agredido na prisão", disse Furukawa,
57, que agora pretende escrever um livro sobre sua experiência de secretário. Leia abaixo trechos da entrevista:
(FABIO SCHIVARTCHE)
FOLHA - Há indícios que apontam
negociação do governo com o PCC
para encerrar os ataques e rebeliões:
a conversa do Marcola com sua advogada dentro da prisão, a ... [Furukawa interrompe]
NAGASHI FURUKAWA - É evidente
que houve negociação. O que
não houve foi acordo. O Estado
não cedeu. A advogada Iracema
Vasciaveo apareceu dizendo
que tinha contatos externos
com pessoas envolvidas nos
ataques e que as ações eram um
sentimento de revolta por conta de notícias de que Marcola
teria apanhado. Se pudesse ver
que ele estava bem, a revolta
iria arrefecer. Portanto, foi tomada uma decisão com toda
transparência. Fui favorável.
Seria uma tremenda irresponsabilidade deixar eles [criminosos] matando pessoas. Foi tão
transparente que a advogada
foi levada de avião pelo governo. A advogada só conversou.
Nenhum pedido foi atendido.
FOLHA - O que Marcola e sua advogada conversaram?
FURUKAWA - A advogada se
apresentou a Marcola exibindo
um número, que imagino seja
um código para que ele soubesse quem ela era. Eles não se conheciam. Ele disse que não poderia mandar parar os ataques,
porque não teria sido ele quem
os determinou. Disse também
que não sofreu tortura nenhuma. Mas veja: a mídia está discutindo a coisa errada.
FOLHA - Qual é, então, a discussão
correta?
FURUKAWA - A preocupação que
atinge as pessoas é discutir como a crise terminou, e não as
suas causas, que é o mais importante neste momento.
FOLHA - O senhor perdeu a queda-de-braço com o secretário da Segurança, Saulo Abreu Filho?
FURUKAWA - Não há vencidos
nem vencedores nesta história.
O governador é que precisa afinar a atuação destas duas secretarias, que é imprescindível
para o sucesso no combate ao
crime organizado. Venho sentindo há muito tempo que há
necessidade de um entrosamento melhor entre as entidades e que a minha presença dificultaria esse entendimento.
Era o momento de parar.
FOLHA - Pode ser mais específico?
FURUKAWA - Há uma dificuldade de entendimento entre a minha pessoa e o secretário. Não
por culpa dele e, creio, não por
culpa minha. Pensamos diferente. Temos visões diferentes
da vida, ideologias diferentes.
FOLHA - E quais foram as discordâncias com Saulo?
FURUKAWA - Não houve uma investigação forte da Polícia Civil,
especialmente na Penitenciária 2 de Presidente Venceslau,
onde foram separados os líderes [do PCC]. Espero que agora
se consiga uma sintonia nas
ações. Mas não quero partir para o campo das críticas.
FOLHA - Nos bastidores, o governador Cláudio Lembo fez críticas à sua
atuação durante a crise. Foi o PCC
que o derrubou do cargo?
FURUKAWA - Não foi o partido
do crime que derrubou o secretário. Se eu fosse de ceder, não
teria ficado seis anos aqui.
FOLHA - O PCC nasceu em 1993 e
se desenvolveu dentro dos presídios
durante sua gestão. O senhor se
sente responsável?
FURUKAWA - Seria muito desejável que esta articulação tivesse acontecido lá atrás. Não era
atribuição da minha pasta combater crime organizado. Não
temos policiais à disposição
nem instrumentos legais, como
quebra de sigilo telefônico e
bancário.
FOLHA - Por que é tão difícil controlar a entrada de celulares na prisão?
FURUKAWA - Não podemos ser
românticos. Em qualquer meio
existe corrupção, até no Congresso Nacional. E os servidores não estão imunes. Os celulares entram por meio de poucos funcionários corruptos e
por deficiência na revista. É
muito complicado revistar partes íntimas de mulheres que visitam os presos.
Texto Anterior: Guerra urbana: Lembo põe interino para chefiar prisões Próximo Texto: Frase Índice
|