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MEDICINA
Remédios têm efeitos colaterais, como hemorragia digestiva; automedicação é apontada como principal causa
Antiinflamatórios são campeões de queixa
ALCINO BARBOSA JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA
Os remédios mais vendidos no
país -antiinflamatórios do tipo
não-hormonal- também são os
campeões das queixas digestivas
em pronto-socorro. É o que mostra pesquisa realizada com 316 pacientes em dez centros de São
Paulo, Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul.
Segundo o coordenador do estudo, o gastroenterologista Décio
Chinzon, "41,3% das pessoas que
procuraram pronto-atendimento
com azia, dor de estômago, náuseas, vômitos ou sangramento intestinal haviam tomado antiinflamatórios não-hormonais".
O consumo espontâneo desses
remédios -ou seja, a automedicação- é apontada como principal fator desse problema. "Para
cada comprimido de antiinflamatório prescrito, outros sete ou oito
são tomados", estima Chinzon.
Os antiinflamatórios são usados
em inflamações recentes, como as
fraturas de ossos e dores musculares, ou inflamações crônicas, como a artrite reumatóide e a osteoartrose. Outros efeitos colaterais se manifestam nos rins e sangue (veja quadro ao lado).
Segundo a Abifarma (Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica), os antiinflamatórios
foram os primeiros no ranking de
unidades vendidas com prescrição (98 milhões) e ocuparam o
quinto posto em faturamento
(US$ 450 milhões) em 99.
O impacto do uso dos antiinflamatórios também já se faz sentir
na infância. "Existe um aumento
da frequência de hemorragia digestiva em crianças nos prontos-socorros em geral", afirma Sandra Grisi, professora livre-docente de pediatria da Faculdade de
Medicina da USP.
Entre 1992 e 1997, o Scut (Serviço de Consultas em Urgência e
Triagem), do Instituto da Criança
de São Paulo, constatou que os
antiinflamatórios foram os principais causadores de sangramento no estômago, superando as
doenças hepáticas -patologias
muito frequentes nesse hospital.
O abuso desses remédios nas
doenças causadas por vírus (gripes, resfriados, amidalites) pode
estar por trás do aumento.
"O pediatra que está na prática
clínica o dia todo nem sempre
tem acesso às pesquisas acadêmicas que mostram a inatividade
dessas medicações na infecção viral. Porém ele recebe os propagandistas de laboratórios, que divulgam esse uso", diz Sandra.
"Não existe comprovação científica de que os antiinflamatórios
mudem o curso das infecções respiratórias virais. (...) Acabam funcionando como medicações sintomáticas, só que, em geral, mais
caras do que os demais analgésicos e antitérmicos", afirma Maria
Helena Kiss, pediatra reumatologista do Instituto da Criança.
Muitos adultos também utilizam os antiinflamatórios nas infecções virais. "Sou totalmente
contra essa prática. São raros os
casos em que os sintomas não podem ser tratados por analgésicos
comuns", diz Francisco Aguiar,
médico do Serviço de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo.
Para Ricardo Fuller, reumatologista do HC, "em amidalites exuberantes, que chegam a sufocar,
seu uso (o de antiinflamatórios)
pode ser justificado".
Os idosos são mais suscetíveis
aos efeitos colaterais dos antiinflamatórios. Na pesquisa de Chinzon, respondiam por 70% dos pacientes com problemas gástricos.
A falta de sintomas não significa
que esses remédios não agrediram o organismo. "Cinquenta
porcento dos pacientes que usam
antiinflamatórios não tem queixas, mas apresentam lesão gástrica à endoscopia", diz Chinzon.
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