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Ex-secretário critica greve e diz que Estado errou também
José Afonso da Silva diz que a paralisação joga a população contra a categoria
Segundo o advogado, governo Serra errou por deixar que a situação chegasse a esse ponto; para ele, é preciso diálogo
ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Ex-secretário da Segurança
Pública de São Paulo entre
1995 e 1999 (gestão Mário Covas, morto em 2001), o advogado José Afonso da Silva disse
ontem que a greve dos policiais
civis, que completa hoje 12 dias,
é um erro porque prejudica a
população e a coloca contra a
própria categoria. Ao mesmo
tempo, também critica o governo José Serra (PSDB), que, segundo ele, errou por deixar que
a greve chegasse a esse ponto.
Para ele, o governo não pode
se recusar a conversar com os
policiais civis em greve, já que
somente o diálogo poderá pôr
fim a essa paralisação.
FOLHA - Qual avaliação o senhor
faz de uma greve da Polícia Civil?
JOSÉ AFONSO DA SILVA - Acho que
esse é um serviço tão essencial,
já que a greve cria problemas
tão sérios para população, que
acaba sendo contraproducente
para o próprio grevista. A população não fica a favor deles. Eu
acho que as autoridades públicas deveriam fazer de tudo para
não deixar que se chegasse a esse ponto. Eu acho que a reivindicação deve ser justa. No nosso caso, chamamos o pessoal da
polícia e até aumentamos os
vencimentos naquela ocasião,
para não se chegar a uma situação dessa.
FOLHA - Os dois lados estão errados nesse caso?
JOSÉ AFONSO - Eu acho que sim.
O governador, o governo do Estado, antes de instaurar a greve,
deveria buscar um modo de satisfazer as dificuldades da polícia para que não se chegasse a
essa situação. Eu acho muito
ruim isso. Não conheço a situação de perto...
FOLHA - Os policiais de SP estão entre os mais mal pagos do país?
JOSÉ AFONSO - Não pode ser assim. Não deve. Você supõe que
SP tenha melhores condições
[de pagar salários melhores] do
que vários outros Estados. O
governo do Estado deveria buscar um meio de solucionar essa
questão o mais rápido possível.
FOLHA - Quais conseqüências essa
greve pode provocar?
JOSÉ AFONSO - O problema é
criar um clima de descontentamento que, depois, faça ficar difícil de se trabalhar. Isso não é
bom para a administração. O
administrador precisa evitar
determinados tipos de crise.
FOLHA - Quando secretário, o senhor conversava com os policiais ou
só com o delegado-geral?
JOSÉ AFONSO - Conversei muito
com associações, sindicatos, fiz
muita reunião com todos eles.
Fiz muita reunião, [o governador Mário] Covas também fazia. Quando chegava a uma certa situação, levava a questão para o governador e pedia a ele
para recebê-los. Houve várias
reuniões para discutir esse problema [salários]. E aumentamos os vencimentos, talvez
nem tanto quanto deveríamos,
mas de acordo com as condições do Estado na ocasião.
FOLHA - O que o sr. acha da decisão
do governo de afastar delegados
que apóiam a greve e, por outro lado, policiais enfrentando o governo
ao colocar os cargos à disposição?
JOSÉ AFONSO - Bastante grave.
Por isso que falo que o governo
não deveria deixar as coisas
chegarem a esse estado. Deveria ter conversado antes. Nunca, em hipótese nenhuma, tivemos algum policial que tomasse atitude contra nós. Eu tive na
minha gestão presidentes de
associações que não gostavam
de mim. Faziam o diabo para
me criar problemas. Nunca tirei o sujeito do lugar dele.
FOLHA - A punição a policiais traz
benefícios nas negociações?
JOSÉ AFONSO - Não. A não ser
que tenha um certo tipo de abuso, aí você não pode deixar. É
muito difícil a gente dizer as
coisas em tese, mas é preciso
tomar muito cuidado. Exonerar alguém só porque está em
greve, não sei se é o caso.
FOLHA - O senhor não faria?
JOSÉ AFONSO - Em princípio,
não. Eu respeito muito o direito
de greve, em primeiro lugar.
Mas isso deveria estar sendo
resolvido o mais pacificamente
possível. [Caso contrário,] Vai
agravando cada vez mais, vai
criando feridas.
FOLHA - Os grevistas querem escolher o delegado-geral. O senhor concordaria com isso?
JOSÉ AFONSO - Eu não aceitaria.
Veja bem: uma autoridade precisa estar subordinada à secretaria e ao governador. Na medida em que você dá eleição, você
cria uma autonomia que não é
aceitável. Essa situação não pode ser tratada como o Ministério Público -são situações
muito diferentes. Se eu estivesse lá, também não aceitaria. Daqui a pouco o comandante-geral [da PM] também vai querer
ser eleito. Aí, não tem mais jeito. Para mim, isso não é democracia. Isso, para mim, é uma
espécie de corporativismo.
FOLHA - Os grevistas pediram, em
ato, a saída do secretário Ronaldo
Marzagão. O que isso representa?
JOSÉ AFONSO - Acho que greve é
para reivindicar salário. Não
pode ser para outra coisa e,
muito menos, para pedir o afastamento de um secretário. Eu
não aceitaria isso. Isso não é
matéria da greve, não pode ser.
Greve para eleição do delegado-geral também não é matéria
de greve. Não aceitaria.
FOLHA - Como parar a greve?
JOSÉ AFONSO - Acho que com
diálogo. Essa história de governador ou autoridade não aceitar o diálogo não é correta. Trabalhamos sempre com muito
diálogo quando estávamos no
governo. Não pode ser assim. A
governança não é uma situação
de imposição pura e simples. E
o Serra sabe disso, ele foi parlamentar por muito tempo. Dialogar, conversar, receber para
conversar não é demérito. É o
contrário: isso fortalece o relacionamento de respeito mútuo.
Eles [os policiais] também merecem respeito.
FOLHA - É difícil lidar com a polícia?
JOSÉ AFONSO - Para ser secretário, precisa saber lidar com
seus subordinados. O secretário da Educação precisa saber
lidar com os professores. Precisa conversar, conversar. Desde
que esse diálogo não ponha em
xeque o respeito que eles devem ao secretário.
FOLHA - O que o senhor acha de o
secretário mandar a PM apresentar
BOs diretamente à Promotoria?
JOSÉ AFONSO - Isso, além do
mais, desrespeita a legislação.
Não pode. A PM não tem competência para fazer essas coisas. Ela não pode assumir as
funções de Polícia Judiciária. O
Ministério Público não pode
aceitar. Diante de uma situação
dessa, tem que recusar. E isso
agrava [a relação entre as polícias]. As polícias Civil e Militar
têm uma rixa velha. Trabalhamos muito isso, mas reconhecíamos que sempre continuava.
FOLHA - Essa orientação do secretário fomenta essa rixa?
JOSÉ AFONSO - Acho que acaba
fomentando. Se quer mudar as
coisas, prepare um projeto para
reformar a polícia.
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