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Daqui ninguém me tira
Moradores do condomínio Parque Cidade Jardim (zona sul),
com apartamentos de até R$ 20 milhões, não precisam sair do
complexo para ir a cabeleireiro, academia ou restaurantes e, contra
as críticas de isolamento, dizem que o importante é a comodidade
ELIANE TRINDADE
DE SÃO PAULO
Usar o elevador para ir à
academia, ao cabeleireiro, ao
veterinário e até ao restaurante preferido é a rotina de
70 famílias em São Paulo.
Elas vivem em uma "minicidade dos sonhos" em plena
marginal Pinheiros.
São moradores do Parque
Cidade Jardim, condomínio
acoplado ao shopping de alto
luxo, de mesmo nome, na zona sul da capital paulista.
"Não dá para calcular o
tempo que deixei de perder
no trânsito", diz Deborah
Quintella, 38, uma das primeiras a se mudar para uma
das nove torres residenciais.
Desde então, a empresária
deixou de ser "mãetorista"
ao matricular os filhos Pietra,
2, Caio, 4, e Luca, 7, em aulas
de circo, balé, natação e judô
na academia do shopping.
Pegam dois elevadores e caminham cinco minutos, mesmo tempo para ir ao cinema.
Antes, é preciso passar por
procedimentos de controle
-segurança virou paranoia
desde os assaltos a duas joalherias entre maio e junho.
"Foi um baque", reconhece Luciano Amaral, diretor
da JHSF Incorporações e síndico do condomínio.
Foram realizadas 14 assembleias para discutir um
novo sistema de segurança,
desenhado por uma consultoria inglesa. "Não vai ter
igual no Brasil", alardeia o
síndico. Ele precisa tranquilizar uma turma que paga até
R$ 7.500 de condomínio.
ANTICIDADE
Comodidade e segurança
são os pilares desse novo
conceito de morar. O complexo Cidade Jardim alia em um
mesmo espaço moradia, lazer, consumo e trabalho.
O megacondomínio é
bombardeado por urbanistas. "Vai de encontro ao conceito de cidade, que é aberta
a todos e serve como ponto
de circulação e de encontro",
critica Maria Lúcia Refinetti,
da Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo da USP.
Para a urbanista, o Cidade
Jardim é a "anticidade": "É
fechado em si mesmo, privilegiando o convívio entre
iguais e o consumo".
As críticas não ecoam entre os moradores. "Eu não vivo na bolha", diz o engenheiro Ernesto Filho, 32, que se
mudou há um mês. Já a empresária Susana Pires, 58,
trocou o Morumbi pelo complexo há seis meses e quer
circunscrever sua vida cada
vez mais ao complexo.
"Só vejo vantagem em viver aqui. A bateria do meu
carro chegou a descarregar.
Faço tudo a pé", diz. Ela ficou
mais de 30 dias sem tirar o
veículo da garagem.
Até trocou de cabeleireiro,
depois de 20 anos. "Vou ao
shopping três vezes por dia.
Faço cabelo, passo no sapateiro e na lavanderia e compro presente de última hora."
A médio prazo, ela quer ter
um escritório em uma das
torres comerciais, que começam a ser entregues em 2011.
Seu endocrinologista inaugura em breve uma clínica no
spa do Cidade Jardim.
As colegas de escola de Juliana, 16, adoram visitar a casa da amiga, tendo como
"quintal" corredores arborizados onde se perfilam vitrines de grifes como Hermès,
Chanel, Louis Vuitton.
Com suas bolsas Tod's (R$
3.800), Burberry (R$ 2.200) e
Chanel (R$ 12 mil) em uma
cadeira, as três fazem o lanche da tarde na Lanchonete
da Cidade (R$ 118).
"Tenho cartão de crédito
para pequenas despesas,
mas para comprar mesmo só
com autorização da minha
mãe", conta a adolescente.
R$ 20 MILHÕES
A população no condomínio vive em um dos metros
quadrados mais caros da cidade. A cobertura custa R$
20 milhões. O apartamento
mais barato, R$ 2,5 milhões.
Tudo ali é voltado para o
público AAA. "Todo dia inventam uma novidade. Agora no hall temos um concièrge 24 horas para pedir uma
pizza, um táxi. É um exagero", diz Deborah Quintella.
A empresária diverte-se ao
contar que também pecou
pelo exagero na festinha de
aniversário do filho, inspirada em "Piratas do Caribe".
Levou bronca pela réplica
gigante de um navio que recepcionou os convidados.
Novos serviços cinco estrelas estão em implantação.
Acaba de ser inserido o "capitão porteiro" em duas torres -onde os moradores toparam pagar a mais para ter
empregado na garagem para
descarregar sacolas e malas.
Também é cotizado pelos
condôminos uma van para
levar os serviçais até o ponto
de ônibus. "Eles tinham de
andar muito", diz o síndico.
Outro ganho, enfatiza ele,
é o empório recém-inagurado. "Faltava um lugar para
comprar umas coisinhas",
afirma, referindo-se a artigos
de alta gastronomia.
Apesar dos requintes, moradores reclamam que foram
esquecidos dois itens nos
72 mil˛ do complexo: padaria
e campinho de futebol.
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