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IRREGULARIDADES NA USP
Pesquisador de Bauru omite sociedade em empresa e consegue R$ 624 mil da Fapesp
Professor obtém verba com dado falso
JOSIAS DE SOUZA
Secretário de Redação
MARIO CESAR CARVALHO
da Reportagem Local
O professor da USP Aguinaldo
Campos Junior enviou dados falsos à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo) para obter recursos para
uma pesquisa da Faculdade de
Odontologia de Bauru.
Em 10 de dezembro de 1997,
Campos Junior remeteu ao órgão
de fomento à pesquisa um projeto
de parceria entre uma empresa, a
Kunzel, e o Napio (Núcleo de
Apoio à Pesquisa em Implantes
Odontológicos). O projeto visa o
desenvolvimento de implantes
dentários. No contrato social da
Kunzel, o professor não aparecia
como sócio.
O dado era falso. Em 5 de abril
de 1995, dois anos e oito meses
antes de enviar o documento à
Fapesp, Campos Junior foi admitido na sociedade, segundo registro na Junta Comercial de São
Paulo. Nesse dia, o professor passou a dividir a direção do negócio
com Aguedo Aragonês.
O contrato enviado à Fapesp era
antigo, de novembro de 1994,
quando o professor ainda não havia se associado à Kunzel.
O dinheiro da Fapesp era enviado ao professor, que o transferia
para ele mesmo, desta vez no papel de empresário.
Negócio de R$ 624 mil
A parceria do professor Aguinaldo com ele mesmo foi contemplada com uma verba de R$
623.957,40 -uma parcela em
reais (R$ 307.637) e outra em dólares (US$ 158.160,20). A verba vai
até 2001, mas o órgão só liberou
R$ 75 mil até agora.
Informado pela Folha da irregularidade, o diretor científico da
Fapesp, José Fernando Perez, disse: "Se constasse o nome dele como sócio da empresa, o projeto
não seria aprovado com certeza".
Segundo Perez, não há uma
norma vetando que professores-empresários obtenham recursos
da Fapesp. Mas havia, segundo
ele, um impedimento ético. A
idéia da parceria é colocar a universidade em contato com empresas para sentir as necessidades
do mercado.
Quando um professor está por
trás do negócio, o princípio fica
comprometido. O professor pode, simplesmente, transferir recursos da USP para a empresa.
"Isso é eticamente inaceitável. É
uma relação incestuosa. Não vamos financiar esse tipo de coisa",
afirma Perez.
Agora, a Fapesp está elaborando uma norma para vetar esse tipo de parceria.
Perez diz que o professor Aguinaldo confirmou ontem ao órgão
que o contrato enviado, de fato, é
velho, e que em 1997 ele já era sócio da Kunzel.
Perez diz que poderá cancelar o
contrato e pedir o ressarcimento
dos R$ 75 mil que já foram liberados. A decisão depende de parecer jurídico da Fapesp.
O envio de dados falsos pode
caracterizar o crime de falsidade
ideológica.
Segundo o artigo 299 do Código
Penal, é falsidade ideológica
"omitir, em documento público
ou particular, declaração que nele
devia constar (...)".
A pena prevista para esse tipo
de crime é a prisão de um a cinco
anos, e multa.
A sociedade na Kunzel não foi o
único dado omitido à Fapesp. O
professor Aguinaldo assinala no
documento enviado que o "desenvolvimento" de implantes
dentários seria feito pelo Napio.
Disse isso em dezembro de 1997.
O problema é que, três meses antes, o Napio havia sido desativado
pela USP.
Segundo Perez, esse dado é irrelevante para a Fapesp, já que o
contrato foi feito com a Faculdade
de Odontologia de Bauru, e não
com o Napio.
Entidade fantasma
Embora tenha sido extinto em
1997, após movimentar pelo menos US$ 2 milhões, o Napio funciona até hoje. Seu patrimônio inclui um centro cirúrgico, um laboratório de prótese, seis consultórios dentários e até um estúdio
de TV.
A USP está prestes a encerrar
uma sindicância em que deve
concluir pela existência de irregularidades. Em 1997, após a extinção do núcleo, o professor apropriou-se da marca "Napio". Registrou-a no Inpi (Instituto Nacional de Propriedade Industrial).
A Kunzel é hoje dona da marca.
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